A velha banda (Um conto real)

Uma Guitarra. O reencontro de uma banda.

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A Ansiedade do Retorno

A multidão aguardava ansiosa. Antigos fãs queriam ouvi-los novamente e os novos queriam conhecê-los, mas a ansiedade era maior ainda entre eles.

Não se apresentavam juntos havia muito tempo. O cenário havia mudado. As canções de sucesso não diziam nada a eles que amavam a simplicidade das velhas músicas.

Será que aceitariam novamente as suas músicas?

“As coisas mudaram muito.” “Não é preciso ser afinado para cantar.” “Presença de palco é tudo.” “Se for bonitinho e souber se balançar, já está ótimo.”

Mas eles já não eram meninos bonitinhos, nem tinham tanta energia para se balançar sem travar a coluna no palco. Ficaram com medo.

O Show da Vida

E enfim, chegou a hora. “E com vocês…”

A plateia aplaudia calorosamente a volta, a volta dos músicos, a volta da música àquela praça.

E com pernas trêmulas, vozes embargadas – a melodia saiu perfeita, carregada numa emoção que não tinham na juventude.

E o show continuou tempo suficiente para que novos conhecessem e entendessem a história e os antigos fãs matassem a saudade.

E o melhor show das suas vidas aconteceu. Havia espaço também para aquelas belas músicas.

E ao fim do show, se abraçaram. Cumprimentaram o público e amorosamente atenderam àqueles que pediram um momento.

E cientes de que a história estava completa, puderam voltar felizes. Sem mágoas.

Podiam parar agora ou até que o desejo os fizesse voltar.

Veja mais em: O tempo ( Contador de histórias) – Jeito de ver.

Estações ( O verão mora aqui)

A foto de um Girassol. Um texto sobre o Nordeste.

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Deste lado do mundo as estações não são bem definidas…
O outono, parece o verão e o inverno se alternando num ritmo frenético…
O inverno convida o verão para participações especiais durante a sua turnê
E na primavera, esqueça as flores.
A primavera traz a estrela maior para o show…
O sol

E você pensa em flores, que cantem as flores
( pra não dizer que não falei de flores)
Aqui primavera, não é prima…é irmã do verão
e traz pólens maravilhosos para a minha alergia…

Ah! O verão?
Acabei de chegar à conclusão:
-É aqui que ele mora!

Gilson Cruz

Veja mais em As pequenas escolhas ( Reflexão) ‣ Jeito de ver

 

 

 

 

 

O maratonista ( uma poesia curta)

A vida de um Maratonista em uma poesia.

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Ao amigo Tomaz

É madrugada, o sono não vem e ele tenta dormir.

Apesar de tudo que viveu e que aprendeu,

sabe que amanhã será mais um grande dia.

Um lugar diferente…

ruas diferentes, companheiros diferentes

não existem inimigos, nem adversários

A cada metro,

a cada quilômetro

controla a respiração,

o tempo

os passos, a pressa…

Sente o cansaço

Não para

Olha por um instante

e contempla as ruas

e passa num ritmo constante.

E constante passa

A vida ensinou que ele nem sempre será o primeiro

o segundo ou o terceiro…

Mas cada fim, cada chegada é festejada.

Cada participação será uma história para contar

Sim, cada história é uma vitória.

Pra quem correr é a vida

E ele corre pra viver.

Gilson Cruz

Leia mais em O dia a dia (Um poema simples) – Jeito de ver

Lembrando os velhos seresteiros

O Último Encontro dos Velhos Seresteiros

Havia uma barraquinha próxima ao muro da igrejinha, na praça que hoje é conhecida como a Praça dos Ferroviários. Era o ponto de encontro dos velhos seresteiros!

Chegavam aos poucos, cada um trazendo o seu próprio instrumento: violões, pandeiros, cavaquinhos… e enquanto a cidade se preparava para dormir, a melodia ditava o ritmo dos sonhos.

Ser menino era meio complicado.
Eu ficava à distância, sentado à porta da minha casa, observando cuidadosamente a entonação e decorando quase todo o repertório.

A “Morena Bela do Rio Vermelho” se envaidecia, mas não podia ouvir o clamor de “Fica comigo esta noite” ou a angústia apaixonada de “Onde estás agora?”

Seu Júlio puxava o coro: “Hoje que a noite está calma…” e, num Sol Maior perfeito, as vozes se encaixavam, dando à noite a impressão de harmonia entre lua, estrelas e apaixonados.

“Maria Helena” era a verbena daquela noite. “Meu Grito” era a oportunidade de desabafar entre “Os Verdes Campos da Minha Terra”. Às vezes, os músicos cansavam. Então, Seu Júlio, amigavelmente, trazia água para os amigos.

Prontinhos, agora hidratados, voltavam risonhos e com muito mais empolgação e emoção para cantar.

Entre “Negue”, “Ronda” e “Vou Sair Para Buscar Você”, chegava a hora de partir. E cantavam “A Volta do Boêmio”.

Era uma reunião de amigos.
Era um show de amigos para amigos.

O Fim de Uma Era

Esses encontros aconteciam apenas nos finais de ano. A cada ano, porém, o número de velhos amigos da serenata diminuía.

Eram quase trinta no início. No último encontro que pude contemplar, restavam apenas seis.
Músicos passam. Músicos morrem.

Por fim, Seu Júlio também faleceu. As serenatas acabaram.

A barraca foi demolida e, em seu lugar, construíram uma linda pracinha. Não há marcas ou lembranças daquele terreno onde a velha barraca resistia entre velhos arames.

Novos e belos músicos nasceram, mas jamais saberão o que era sentar entre amigos, rir das próprias falhas, cantar no mesmo tom sem competir. Eles não compreenderão como é bom cantar junto, dividir o prestígio, a emoção, o momento. Assim como deve ser a arte.

A Celebração da Amizade

Talvez a lua não provoque mais a mesma emoção. As pessoas mudam com o tempo e podem pensar que seria tolice cantar sob noites enluaradas.

Mas os seresteiros sabiam: não era a lua em si. Era a celebração da amizade, do amor, em belas e antigas canções. Eles sabiam que um dia tudo aquilo passaria e, por isso, precisavam se encontrar. A lua era apenas um pretexto.

Que os novos amigos encontrem sempre um motivo para se reunir, para celebrar. A vida passa.

Hoje, depois de tanto tempo, me pergunto: “Os velhos, incansáveis seresteiros quase não paravam. O que será que tinha naquela água que Seu Júlio servia?

Gilson Cruz

Leia mais em O tempo ( Contador de histórias) – Jeito de ver

Zé da Ladeira – uma história de futebol.

O fenômeno futebolístico da ladeira

Ele rolava e enrolava…

A Ascensão do Zezinho

Ninguém jogava tão bem quanto o Zezinho, que morava lá no fim da vila, no pé da ladeira, na casa 113. Poucas pessoas acreditavam que aquele magricela, driblador, faria tanto sucesso no bairro. Mas seu pai, o senhor José, o levava diariamente para os testes, pois sabia que ele era realmente bom.

O tempo o preparava… até que o dia chegou. Robson, o principal jogador da vila, torceu o tornozelo numa dividida com Marquinhos. Era apenas um treino, mas Robson não conseguiu tirar o pé do quarto buraco na lateral da grande área. E lá ficou o moleque, chorando e desesperado, pois o encontro dos bairros aconteceria e ele não jogaria.

Era a chance do Zezinho. Seu Lourival não tinha reservas no banco e, vendo o menino franzino ansioso por entrar, pensou: “É apenas um treino!” Convidou o Zé e, em tom de brincadeira, disse: “Arrasa aí, moleque!”

E o moleque arrasou. Na primeira bola, soberbo, driblou seu próprio companheiro de time, enganando os adversários que não entenderam aquilo. Desafiando as leis da gravidade, voou até a entrada da grande área e chutou suavemente a pelota, que morreu no ângulo direito. O goleiro voou ao máximo, mas onde a bola entrou, nem o Zetti chegaria.

O Fenômeno da Ladeira

O Zezinho arrasou, mas algo chamava a atenção. Sempre que ameaçado, ele rolava, se contorcendo, como se estivesse morrendo. Quando o treinador, convencido, assinalava a falta, ele levantava feliz, zombando do adversário. “Antipático”, diziam os colegas, e entre estes ele ganhou o nome de Zezinho da Ladeira, pois rolava como se estivesse descendo a ladeira da rua onde morava toda vez que esbarrava em alguém.

E os juízes sempre expulsavam o adversário, mesmo nos treinos! Seu Lourival ficou encantado: o time da vila teria agora um gênio, uma arma secreta contra as defesas dos outros bairros. E assim aconteceu. Nos torneios do bairro, aquele menino brilhava e o time ganhava tudo e de todos: 10×1 nos Pernas Quebradas Esporte Clube, 9×3 no Tamanco Social e incríveis 7×1 na seleção de Pardais Famosos, o maior campeão dos torneios.

A fama crescia. Todos queriam falar do Zé, a maior promessa do futebol. O pai do Zé via o futuro: oceanos de dinheiro na conta dele e do Júnior. Os músicos cantavam ‘Tocou no Zé é gol’, e os locutores dos torneios bajulavam o moleque — mais até do que os políticos e patrocinadores. Para os locutores, ele não era mais o Zé da Ladeira; era o Menino Zé.

A Queda do Ídolo

O Zé cresceu mais que o time. Começou a humilhar os colegas, não respeitava os adversários e chegou a contratar locutores para cantar suas vitórias, ganhando mais fãs. Mandou até o seu Lourival calar a boca! Depois dos torneios de bairro, a meta era o título da cidade. Eles ganharam, mas os locutores, comprados, transformaram os onze que se mataram em campo em meros coadjuvantes. Graças ao Zé da Ladeira, o time da rua era agora campeão municipal.

Era a hora de enfrentar as potências do estado. Com fama e dinheiro, o Zé descobriu que bastava se jogar e rolar pelo chão para garantir vantagem. Ou o adversário ficava irritado e o agredia, sendo expulso, ou o juiz expulsava o adversário antes mesmo disso acontecer. Expulsando a todos e rolando pelo gramado, o Zé ganhou títulos, dinheiro e comprou tudo que o dinheiro podia comprar: casas, barcos, aviões, carros e até um caminhão cheio de amigos.

E foi embora do time do bairro, que acreditava que ganharia algo por descobrir aquele talento. Desde então, o time foi definhando aos poucos, vivendo apenas das memórias de um menino magricela que rolava como uma bola nos gramados. Restam agora apenas um campinho seco, traves quebradas, e nem mesmo o Sr. Lourival desfila por lá.

Hoje, para mostrar que ainda lembra a sua origem, Zé da Ladeira contrata cineastas para produzir um lindo documentário sobre sua vida, com depoimentos inventados, arrancando lágrimas dos antigos torcedores. E, claro, enchendo a pança de dinheiro.

Os trouxas, enganados, continuarão cantando: “Tocou no Zé é gol” e, ao assistir à sua trajetória, dirão: “Pobre Zé da Ladeira”. Enquanto isso, o pobre Zé, rolando e enrolando a todos, continuará enchendo ainda mais a pança de dinheiro!

Gilson Cruz

 

Veja também: Quiprocuó Esporte Clube – Falando de futebol ‣ Jeito de ve

 

 

 

A mais bela voz ( Uma história)

Escrevendo. Um texto sobre um amigo de verdade.

Imagem de jlxp por Pixabay

Sabe aquele tipo de pessoa que parece impossível de esquecer?
Sim, essas pessoas existem!

Quando eu ainda era jovem (e isso já faz muito, mas muito tempo!), lembro de um período de depressão.

Era um tempo de perdas, de afastamento da família e, sinceramente, eu não sabia o que fazer…

Morava na cidade da minha paixão, um pequeno município chamado Santa Terezinha, no interior da Bahia.

Silêncio e amizade

A cidade era pequena, acho que ainda é. A praça tinha grandes árvores, o vento adorava soprar no meu telhado, eu tinha medo dos raios e trovões, e um escorpião resolveu me picar só para me lembrar que eu não estava sozinho no mundo… Ah, e a dengue também me pegou duas vezes, de jeito!
Mas o povo era amável, e os dias eram bem ocupados.

Sim, os dias eram ocupados. Trabalhava o dia inteiro e, sendo jovem, não tinha muitos amigos.
Até que, num desses meses de junho, recebi a notícia de que uma das melhores pessoas que conheci, que amava de coração, havia falecido em seus vinte e poucos anos…
Confesso que não queria ter amigos por perto! E, até hoje, não sei por quê.

E então, num desses dias, ele aparece.
Me convida para passar em sua casa.
E, na maior simplicidade, me apresenta algo que um péssimo guitarrista como eu só tinha visto a centenas de quilômetros de distância. Não resisti à tentação. Lembro do espanto:
“Rapaz, que arsenal!”
Mesas de som, caixas, microfones, guitarras, baixo, teclado… Ele sabia que eu cantava razoavelmente mal, mas fazia questão de que eu cantasse!

Ele não dava conselhos, apenas respeitava o silêncio, a dor… E, quando podia, me ajudava a desabafar com aquilo que me agradava.

É engraçado como hoje tenho mais ou menos a mesma idade que ele tinha naquela época… E percebo quanto sofrimento devia ser para aquele sujeito de bom ouvido escutar um moleque tão desafinado!

Mas ele escutava, escutava, escutava…

As memórias que ficaram

Anos mais tarde, encontrei uma daquelas fitas que ele costumava gravar.
Numa das faixas, ele tocava suavemente um piano elétrico — talvez num Dm (Ré menor), não lembro mais —, enquanto eu, com uma guitarra Giannini Craviola, fazia o possível para não estrangular a música…
E a música fluía, entre gargalhadas e brincadeiras.
E ele soltava a voz…
A voz mais tranquila e afinada…
Que gostava de rir…
E que se calava quando o silêncio ajudava.

Ah, antes que eu me esqueça: estraguei a música, como de costume… mas só um pouco!

Uma melodia inesquecível

Hoje, um tanto mais velho e com a audição comprometida, consigo ouvir em meu coração cada nota, cada palavra… cada silêncio daquela pessoa, daquele amigo lá da minha juventude.

É bom ter pessoas que não esquecemos. Essa é, sem dúvida, a mais bela voz que pode existir.

Ao meu amigo e irmão,
Rogério Alves.

Veja mais em Depressão – como ajudar? (Informativo) – Jeito de ver.

E LÁ ESTAVA ELE! ( um dia incomum)

Um Velho Senhor parado no tempo.

E lá estava ele.

GChaves

Reflexões no trajeto urbano

Sempre a passeio pelas ruas da cidade, contemplando momentos de descontração e reduzindo obrigatoriamente a velocidade no trajeto urbano (devido aos quebra-molas), os pensamentos fluíam em uma concentração necessária. Talvez, assim, o estresse e a ansiedade diminuíssem, proporcionando àquela mente inquieta um pouco de alívio.

Porém, num certo dia, enquanto seguia o mesmo caminho, algo chamou a atenção. Uma cena, aparentemente familiar, repetia-se.

O senhor do tempo

No passeio de uma humilde residência, lá estava ele!
Um senhor que imediatamente capturou o olhar. Sentado com o olhar fixo no vazio do tempo, suas pernas cruzadas, jeans surrado, camisa de mangas compridas, sandálias Havaianas pretas e um relógio — talvez um Oriente — compunham sua figura serena.

Era perceptível que ele pertencia àquela humilde residência e ao mesmo tempo transcendia o lugar, perdido em pensamentos que só ele compreendia. A imobilidade daquele corpo contrastava com a intensidade de sua mente, que parecia viajar para lugares desconhecidos.

Seu semblante carregava o cansaço de um passado que provavelmente o marcara profundamente. A pele enrugada revelava o tempo vivido, enquanto a falta de expectativas no olhar sugeria que ele aceitara o ritmo lento e descompromissado dos dias. Era como se o senhor e o tempo compartilhassem o mesmo espaço vazio e sem pressa de avançar.

A companhia inesperada

Dias depois, em outro passeio pela cidade, o cenário se repetiu — mas com um detalhe novo e surpreendente.
Era um dia chuvoso, com chuviscos escorrendo pelo para-brisa. E lá estava ele novamente, sentado na mesma posição serena, como se nada pudesse perturbar sua paz.

Dessa vez, porém, havia um companheiro: um cão vira-lata de pelagem branca com manchas pretas — ou preta com manchas brancas, isso pouco importava. O que realmente fazia diferença era o vínculo entre o homem e o animal. Sob as gotas de chuva, enquanto o senhor olhava para o vazio do tempo, o cão deitava-se ao seu lado, compartilhando o momento de calma e silêncio.

Parecia que o homem, envolto em suas realidades internas, havia encontrado em seu fiel amigo uma presença que o conectava ao mundo exterior. Uma parceria simples, mas carregada de significado.

O que virá depois?

Certamente, ao passar novamente por aquela rua, a cena se repetirá: o senhor no mesmo lugar e talvez seu companheiro ao lado.

E, quem sabe, o observador ansioso e estressado tomará coragem para se aproximar, descobrir um pouco mais daquela mente que tanto despertou sua curiosidade, e aprender algo sobre a quietude que tanto busca.

Gilmar Chaves 21/05/2023

Gilmar Chaves, Professor, Poeta, Conselheiro e membro da formação inicial da Banda Experiência. A arte de observar e fazer parte da história.

Veja mais em: O tempo ( Contador de histórias) – Jeito de ver.

Ouvir estrelas (Poesia clássica)

“Ora (direis) ouvir estrelas! CertoPerdeste o senso!

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“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto…

E conversamos toda a noite, enquanto
A via-láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: “Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?”

E eu vos direi: “Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas.”

(Poesias, Via-Láctea, 1888.)

Olavo Bilac

Comentando a poesia

Esse é um dos sonetos mais belos e conhecidos de Olavo Bilac, extraído do livro Via Láctea (1888).

Este soneto carrega a essência do Parnasianismo na forma impecável e no rigor métrico, mas também transborda lirismo e subjetividade, flertando com o Simbolismo.

Aqui, Bilac constrói uma metáfora poderosa sobre a sensibilidade e a capacidade de perceber a beleza e o mistério do universo.

O eu lírico enfrenta a incredulidade daqueles que não compreendem sua comunhão com as estrelas, representando a oposição entre razão e emoção, lógica e sentimento.

Ao que a resposta final—”Amai para entendê-las!”—é um convite à sensibilidade, sugerindo que só através do amor é possível captar o que é invisível aos olhos e inalcançável pelo intelecto frio.

Sim, essa ideia de que o amor é a chave para compreender o sublime é profundamente tocante.

O poema sugere que há mistérios no mundo—representados pelas estrelas—que a razão sozinha não pode desvendar. Só quem sente profundamente, quem ama, pode realmente “ouvir” e entender essas verdades mais sutis.

Melancolia e Solidão

Além disso, há algo de melancólico e solitário no eu lírico, que passa a noite em vigília, encantado com as estrelas, mas também enfrentando a incompreensão dos outros. Esse contraste entre a frieza da razão e o calor da emoção torna a mensagem ainda mais envolvente.

A superficialidade e a pressa da vida moderna tornam essa contemplação cada vez mais rara.

Parece haver uma desconexão entre o sentir e o viver, como se as pessoas estivessem sempre correndo atrás de algo—sucesso, status, prazer imediato—mas sem realmente se permitirem sentir com profundidade.

O amor, como Bilac sugere, não é apenas um impulso ou um desejo, mas uma forma de percepção. Ele nos dá um olhar mais sensível sobre o mundo, nos permite “ouvir estrelas”, ver a beleza onde outros veem apenas o banal.

Cabe a seguinte reflexão: “Será que ainda há espaço para esse tipo de sensibilidade no mundo de hoje? “

Conheça O poeta ( Uma poesia simples) – Jeito de ver

Resumo biográfico

Olavo Bilac (Olavo Braz Martins dos Guimarães Bilac -1865-1918 ), foi um dos maiores poetas do Brasil, principal nome do parnasianismo, e um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras, criou a cadeira nº. 15, que tem como patrono Gonçalves Dias. – Olavo Bilac | Academia Brasileira de Letras

Sua atuação não se restringiu à literatura, destacando-se também pelo forte engajamento cívico e político. Defensor do serviço militar obrigatório, escreveu a letra do Hino à Bandeira e fez oposição ferrenha ao governo de Floriano Peixoto, chegando a ser preso em 1891.

Desde jovem, Bilac mostrou talento para as letras. Ingressou na faculdade de Medicina por influência do pai, mas abandonou o curso para se dedicar ao jornalismo e à literatura. Trabalhou em diversos periódicos e publicou seu primeiro soneto, Sesta de Nero, em 1884, recebendo elogios de Artur Azevedo.

Olavo Bilac, principal nome do Parnasianismo no Brasil

Wikipedia

Em 1907, foi eleito “Príncipe dos Poetas Brasileiros” pela revista Fon-Fon.

Frequentador de rodas literárias e boêmias no Rio de Janeiro, Bilac teve uma vida social intensa. Ocupou cargos públicos e dedicou-se à produção de poemas, crônicas, livros escolares e até textos publicitários.

Curiosidade: Em 1897, sofreu o primeiro acidente automobilístico registrado no Brasil.

Bilac viveu sozinho, após dois noivados desfeitos, e faleceu em 1918, vítima de edema pulmonar e insuficiência cardíaca. Sua influência no cenário literário e cívico é eterna, imortalizando-o como um dos grandes nomes da poesia brasileira.

Explicando o Parnasianismo

O parnasianismo foi uma escola literária surgida na França, no século XIX, como uma reação ao sentimentalismo e subjetividade do romantismo. Caracterizou-se pelo rigor formal, objetividade e busca da perfeição estética na poesia.

Os parnasianos valorizavam a métrica rígida, as rimas ricas e a linguagem refinada, muitas vezes explorando temas clássicos e mitológicos.

A poesia parnasiana enfatizava a arte pela arte, ou seja, o compromisso maior era com a estética, e não com emoções ou engajamentos sociais.

Contos de Carnaval (uma história com H)

Máscaras de carnavais e bailes de fantasia. Um texto bem humorado sobre o carnaval no interior.

Imagem de Adriano Gadini por Pixabay

A Multidão e o Ritmo do Carnaval

A cidade se aglomerava e, de repente, Dona Margarete gritava:
“Eu falei Faraó…”

Automaticamente, a multidão seguia naquela mais que animada romaria, cantando:
“Ê Faraó… Ê Faraó…”

Mas sou capaz de apostar que a maioria das pessoas não sabia cantar metade daquela letra complicada e imensa! Os compositores eram realmente geniais. Para a multidão, o importante era tentar cantar as frases ou mesmo as sílabas que conseguiam lembrar, esbarrar nos outros, dançar e, na maioria das vezes, apenas pular!

E por falar em dançar, a cada nova estação surgia uma nova dança: a dança da galinha, o Fricote, o Tchu-tchu, a manivela… Não dá pra lembrar de tudo! Esse era o Carnaval na capital e no interior da Bahia.

No interior, havia a micareta (e no momento NERD do dia, lembro que micareta vem de uma palavra francesa que significa “meio de quaresma”, período entre os dias 14 de fevereiro e 28 de março) e o trio elétrico tocando canções nordestinas animadas, arrastando um monte de gente pela cidade, num tour divertido, mas barulhento pra caramba!


O Trio Elétrico: A Invenção que Fez História

A banda Bamda Mel (isso mesmo, BaMda) puxava o “Prefixo de Verão” e pregava a paz na “Baianidade Nagô”. Um Cometa mambembe atingia em cheio a multidão que só queria “botar o bloco na rua”, enquanto o Frenesi balançava a massa.

Cabia tudo naquelas ruas: de Senegal, Moçambique, Madagascar e Bagdá a “Egito, Egito ê!” Quando a rodinha apertava, Sara Jane pedia que abrisse, mas era um “Auê” quando faltava freio no trio elétrico!

E por falar em falhas mecânicas, um dia os freios do trio foram curtir no meio do povo, e o caminhão desceu a ladeira desgovernado. Acho que os músicos ou se empolgaram demais ou se borraram de medo, pois o axé soou como um perfeito heavy metal! Poucas pessoas tiveram as pernas quebradas e, por sorte, não entraram para o grupo dos que “não iam atrás do trio elétrico” por motivos óbvios, como cantava Moraes Moreira.

Tudo começou na década de 1950, quando Dodô e Osmar colocaram aparelhos de som em um Ford 1929, conhecido como Fobica. No início, eram a Dupla Elétrica. Viraram Trio Elétrico ao convidar Temístocles Aragão, e o nome pegou. Na década de 1970, Moraes Moreira tornou-se o primeiro cantor de trios, e Armandinho Macêdo revolucionou com sua guitarra baiana.


Transformações e Nostalgia

Os blocos começaram a contratar artistas para animar seus associados protegidos por cordas, enquanto os “pipocas” aproveitavam o espaço que sobrava. O repertório do Carnaval mudou, e artistas de outros estilos foram incorporados. No interior, o prefeito pedia ao trio elétrico que parasse perto do cemitério para homenagear os foliões de outros tempos.

Quando as coisas esquentavam no centro, o guarda Miguel dava três tiros para o alto, lembrando que a homenagem aos antigos foliões já havia acontecido e que os brigões poderiam ser os homenageados do ano seguinte.

A Banda Doce Magia seguia com sua música, patrocinada pelo “costumeiro” apoio à cultura das pequenas cidades. Ah, como era bom quando tudo parecia ser mais simples, leve e cheio de histórias para contar.

Conheça mais a história dos micaretas no Canal MICARETAS ANTIGAS

Foto Almeida NO YOUTUBE, do pesquisador Ananias Almeida.

https://www.youtube.com/@micaretasantigasfotoalmeid7790

Veja mais em Um pouco de exagero (Humor) – Jeito de ver

Tradições – o que se precisa saber? ‣ Jeito de ver

O baile (Um último encontro)

Um baile. Um texto sobre um último encontro.

Imagem de Ri Butov por Pixabay

Eu não sabia que seria aquela a última vez que iria te ver
Chovia
O baile que começaria às oito, achava que provavelmente seria adiado
pois a eletricidade em nossa pequena cidade não tem um bom relacionamento com qualquer tipo de chuva
A escuridão queria um pouco mais de espaço

Imaginei…
Ela não deve vir…
Os sapatos e o vestido brancos
E o laço vermelho nos cabelos…
Não queria imaginar os teus olhos

A chuva ficava ainda mais forte
E ainda assim o baile começava
E a banda começava a tocar aquela música

Lá dentro os pares, já não sentiam medo
Dançavam
Deslizavam pelo salão
E eu te imaginava …

Confesso, não estava desapontado
Nem todos tinham carro naquele tempo…
E quanto a mim… nem bicicleta!
Mas, não queria que a chuva fria te molhasse

E a música continuava
E na chuva resolvi dançar sozinho, na chuva
Girava…
Escorregava na rua lisa
De olhos fechados
Aproveitava a festa sozinho
Lá mesmo, lá fora, na chuva

E antes mesmo de a música acabar
abria os meus olhos,
E lá estavas tu…

Me olhando
Sorrindo
De rostinho molhado
De vestido molhado
De sapatinhos molhados…

E de repente, te estenderia a minha mão
E vinhas…
E lá, sob a chuva
Mas, sobre as nuvens
dançávamos… até o fim

da música, da noite

No que seria a última vez.

Gilson Cruz

Veja mais em: O tempo ( Contador de histórias) – Jeito de ver.

© Gilson da Cruz Chaves – Jeito de Ver Reprodução permitida com créditos ao autor e ao site.