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O Laço de Fita
Castro Alves
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Castro Alves
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Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver !
Não és sequer a razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida !
Não vejo nada assim enlouquecida …
Passo no mundo, meu Amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida !
“Tudo no mundo é frágil, tudo passa …”
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim !
E, olhos postos em ti, digo de rastros :
“Ah ! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus : Princípio e Fim ! …”
Florbela Espanca
Esse soneto de Florbela Espanca é uma das mais belas expressões do amor absoluto e arrebatador. O poema é um exemplo clássico da poesia ultrarromântica, onde o eu lírico se entrega completamente à figura amada, transcendendo qualquer limite racional. Desde o primeiro verso, percebe-se a intensidade dessa entrega:
“Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida”
O amor não é apenas um sentimento, mas uma totalidade que domina a existência da poeta. A visão do ser amado é tão constante que a realidade ao redor se dissolve – os olhos ficam “cegos de te ver”.
Na segunda estrofe, Florbela reforça essa ideia ao comparar a leitura do amado a um livro misterioso, cujo conteúdo é sempre o mesmo, mas nunca deixa de ser fascinante. O terceiro quarteto introduz um contraponto interessante: a noção de efemeridade. O mundo é passageiro, tudo se desfaz, mas a voz interior da poeta nega essa transitoriedade com uma fé inabalável no amor.
Esse soneto é um exemplo marcante da poética de Florbela Espanca, caracterizada pelo excesso emocional, pela paixão intensa e por uma sensibilidade à flor da pele. Sua poesia expressa uma entrega absoluta ao amor, quase como uma fusão entre o eu lírico e a figura amada. Florbela não apenas ama, mas se dissolve nesse amor, tornando-o o próprio sentido de sua existência.
A busca pela completude é evidente em versos como:
“Não és sequer a razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!”
Aqui, o amor deixa de ser uma parte da vida e passa a ser a vida inteira.
E então vem o impacto dos versos finais:
“Ah! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: Princípio e Fim!”
O amor alcança sua máxima elevação: ele é eterno, absoluto e divino. A hipérbole e a comparação com Deus enfatizam o fanatismo do título – um amor que transcende até mesmo as leis do tempo e do universo. A última estrofe reforça essa busca pelo absoluto, recusando a efemeridade das coisas e se refugiando na ideia de um amor que transcende o tempo e a realidade. Isso reflete bem sua intensidade emocional e espiritual, tanto na poesia quanto na vida.
Analisando a biografia da autora, percebe-se que ela idealizava o amor como um refúgio para suas dores, um porto seguro para suas feridas emocionais. No entanto, sua intensidade e exigência emocional tornavam essa busca frustrante. Para ela, o amor deveria ser algo divino, eterno e absoluto, como expressa em Fanatismo, mas a realidade raramente correspondia a essa visão.
Isso também explica a melancolia presente em seus versos: mesmo quando o amor acontece, ele nunca é suficiente para preencher o vazio da alma. Talvez o maior amor de Florbela tenha sido justamente esse amor inatingível, que ela alimentava mais na imaginação do que na vida real.
Florbela Espanca (1894–1930) foi uma das maiores poetisas portuguesas, reconhecida por sua escrita intensa e emocional. Sua obra, permeada por temas como amor, sofrimento, solidão e busca pelo absoluto, reflete uma vida pessoal marcada por desafios e crises emocionais profundas.
Nascida em 8 de dezembro de 1894, em Vila Viçosa, no Alentejo, era filha de Antónia da Conceição Lobo e do republicano João Maria Espanca. Fruto de uma relação extraconjugal, foi reconhecida oficialmente pelo pai apenas após a morte da mãe, que faleceu quando Florbela tinha 14 anos. Criada na casa paterna, desde cedo demonstrou talento literário, assinando seus primeiros textos como Flor d’Alma da Conceição e escrevendo poemas dedicados ao pai e ao irmão Apeles.
Florbela Espanca teve uma vida marcada por intensas dores emocionais, perdas e desilusões, que contribuíram para um fim trágico.
Ela foi uma das primeiras mulheres a frequentar a universidade em Portugal, ingressando na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa em 1917. Antes disso, estudou no Liceu Nacional de Évora, onde teve contato com autores como Balzac, Dumas e Camilo Castelo Branco. Sua carreira literária iniciou-se com Livro de Mágoas (1919), seguido por Livro de Soror Saudade (1923), obras que se destacam pelo lirismo intenso, paixão e melancolia. Influenciada pelo ultrarromantismo e simbolismo, sua poesia carrega uma sensibilidade exacerbada, erotismo e uma busca constante pelo amor transcendental.
Sua vida amorosa foi instável, com três casamentos fracassados. Em 1927, sofreu um dos maiores golpes de sua vida: a morte de seu irmão Apeles em um acidente de avião. A perda a mergulhou em profunda tristeza e inspirou As Máscaras do Destino, publicado postumamente.
Nos últimos anos de sua vida, Florbela também sofria de problemas de saúde, incluindo doenças nervosas e psicológicas, agravadas por uma série de crises existenciais. Em 1930, após várias tentativas de suicídio, acabou falecendo no dia do seu aniversário, 8 de dezembro, possivelmente por overdose de barbitúricos.
Sua morte precoce reforçou a aura trágica que a cercava, mas sua obra continua a emocionar gerações. Seu soneto Fanatismo ilustra bem sua entrega ao amor idealizado:
“Não és sequer a razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!”
Essa devoção absoluta revela uma mulher que ansiava por plenitude emocional, mas se via constantemente frustrada pela realidade.
A sua arte continua viva, e sua poesia segue encantando e emocionando gerações. O soneto Fanatismo fez grande sucesso no Brasil ao ser interpretado musicalmente pelo cantor cearense Raimundo Fagner.
Veja também: Ouvir estrelas (Poesia clássica) ‣ Jeito de ver
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Casca de banana…
Jurei por tudo,
Prometi que jamais iria cair novamente…
Paixão faz sofrer,
Faz chorar…
Nos deixa com cara de bobos,
Nos rouba o sono,
Faz perder noites,
até mesmo sumir o apetite!
Jurei,
Nunca, jamais…
Paixão é doença
Que mata a gente,
de tanto sonhar, de planejar,
E que não dá futuro.
Atrapalha a concentração…
E até revira o estômago.
Nos deixa bobos e ainda mal-humorados.
Maldita paixão…
E de repente você aparece…
E lá estou eu, no mesmo caminho, escorregando de novo,
Com a mesma carinha de bobo!
Fazendo as mesmas bobagens! De novo!
Leia também: Versos sem destino ( um conto ) ‣ Jeito de ver
Num dia sem sentido,
me sentei
E o tempo sentou-se ao meu lado.
E a história amou acontecer…
E o tempo adorou contá-la.
Gilson Cruz
Veja mais em A esperança (Poesia de resistência) ‣ Jeito de ver
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Num canto da sala o violão
No outro
os livros na estante imploram atenção…
Nada substitui o canto
Nada
Nada substitui o encanto…
de transformar
risos em melodias
palavras em versos
E abraços
em universos…
Nada substitui o riso
nem preenche a ausência
desse espaço, que já foi conquistado
Nada substitui
Nada preenche
Nada…
Apenas a solidão
e a incompreensão de ser feliz
com as lembranças de algo eterno.
Gilson Cruz
Leia mais Flores pobres (Sonhos interrompidos) – Jeito de ver
Imagem de Mohamed Hassan por Pixabay
Pele negra, cor da noite
Riso prata, de lua
Me conta a tua história
Esta história só tua
Com esses olhos de estrelas
N’uma noite de luar
Me conta quais são teus sonhos
p’ra que eu possa sonhar
Me fala dos teus sorrisos
Da mágoa que já passou
Do futuro que não houve
De um amor, que sempre amou
Me conta o que te inspira
O que te faz esperar
Que’ste teu riso de prata
Num riso faz acordar
Me explica, como acontece
Tanta beleza de olhar
Que essa pele da noite
um sonho faz recordar
Esse pobre poeta,
Que em teu sorriso encontrou
Olhos de luz, de estrelas
E nesse instante amou
Procura na noite, na lua
Beleza pr’a comparar
E como em sonhos, flutua
Em doces canções de ninar…
A sonhar…sonhar…
Gilson Cruz
Veja mais em: Do começo ao fim… ( Como a vida é ) – Jeito de ver.
Saí
olhei a velha praça e as flores no jardim
Senti o sol morno, da Primavera
e o vento suave que vinha dos morros.
Iluminavam e abriam caminho
Os passarinhos não queriam acordar
Não cantavam por onde eu andava
Talvez percebessem a solidão
E a tristeza em meus passos
E eu contava os dias
Para esquecer um passado recente
e a esperança que morrera
no horizonte…
Para esquecer que estava só,
num mundo tão grande,
imenso
E as pessoas
que sorriam e viam o meu riso
não viam a dor em meus olhos…
Que imploravam,
ao menos uma mão
algo que desse sentido aos meus passos…
Mas, os dias passavam
e o tempo passava…
E quando na pressa de viver,
de dar sentido a tudo,
e continuar vivendo…
Saí… na mesma direção
e abraçando a estrada,
deixei a porta aberta.
Gilson Cruz
Leia mais em Motivos… ( Não desistir!) – Jeito de ver
Me perguntas, como se mede o tempo?
Milésimos?
Segundos?
Minutos?
Horas?
Dias?
Semanas?
Meses?
Anos?
Décadas?
Séculos?
Milênios?
E eu te digo:
Não se mede o tempo
Não se conta as horas…
O tempo só existe de verdade
Para quem sabe o que é saudade…
Gilson Chaves
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De um lado
A razão escapava
E do outro
O ódio tomara seu lugar
Fazia companhia à morte…
A razão
E a esperança
Fugiam juntas para longe…
Não haveria mais
valores,
Amores,
Cores…
Apenas um cenário destruído.
O tirano
Que se referia a um povo
Como a animais
encontrava um pretexto
para a tirania.
O extremista
Conseguia os olhos do mundo
Enquanto
as crianças inocentes
Morriam…
Crimes de guerra aconteciam…
Enquanto as cores em sépia
Tomavam conta do quadro
Numa pintura de tristeza
A sede se desesperava…
E os inocentes crentes
Erguiam os olhos aos céus
Imaginando um Paraíso além…
Pois não havia mais
outra esperança.
E os senhores da Guerra
Ignoravam convenções
Inventavam novas histórias…
Enganavam seu próprio povo
Eliminavam um povo..
Os perversos sorriam
Ao passo que
nações perplexas
Se perdiam
Sem acordos, sem palavras
E a humanidade perplexa
Perecia.
Perdia-se a humanidade.
Gilson Cruz
Veja mais em Notícias de Guerras – o jogo da informação ‣ Jeito de ver
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Difícil era não olhar…
a tua pele rosada
teus olhinhos claros
e eras pequena…
éramos pequeninos.
Difícil era não se perdoar,
por tropeçar cada vez que te via.
Timidez não era privilégio
e ser bela, não era pecado…
Difícil era saber que ao partir
não te veria…
além dos meus sonhos.
E que os sonhos, nem sempre se realizam.
Difícil
foi te ver partir…
Gilson Cruz
Veja também: O fim (Cenas de um último encontro) ‣ Jeito de ver
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