É preciso admitir que nem sempre as palavras certas virão
quando precisarmos falar,
nem as atitudes corretas
nos momentos delicados e precisos.
É preciso aceitar que nem sempre
seremos os primeiros a chegar
e que, às vezes, sequer chegaremos…
É preciso aceitar que nem sempre
nos equilibraremos quando soltarem as nossas mãos
e, certamente, daremos com a face na terra…
É preciso também aceitar que nem sempre
seremos amados ou odiados,
e que nem sempre conseguiremos retribuir o amor
a quem merece
e que nos mostrou sem hesitar.
É preciso…
É preciso admitir
que, muitas vezes, fomos tolos,
que erramos ao julgar
e que fomos mal julgados,
e que não éramos tão necessários quanto queríamos
em algumas ocasiões.
É preciso…
É preciso admitir, aceitar que erramos…
e que ainda é tempo de fazer o melhor,
e fazê-lo.
E quando ela surgia entre os montes
as palavras se calavam, por instantes…
E era neste instante que os namorados passavam de mãos dadas
e paravam juntos na ponte
que separava as duas partes da cidade, sobre o riacho.
Os momentos…
E como numa fotografia,
beijavam-se timidamente
e era possível, amar o cenário.
Enquanto isso o velho músico se dirigia ao abrigo escuro
das sombras das árvores,
daquelas árvores imensas que ficavam próximas à igreja,
e dedilhava acordes mágicos
dando ao cenário o fundo musical necessário para eternizá-lo.
E amigos se aproximavam,
para cantar canções de amor,
cantar paródias, piadas…
canções que se perderam no tempo.
E as meninas passavam brincando com os pequeninos,
enquanto os pais, aproveitavam para esquecer seus problemas
dentro de suas casas
e saíam para contemplar o instante.
De mãos dadas,
aproveitavam para lembrar do começo
e se comprometiam a recomeçar todos os dias.
As recordações…
Hoje, velhas fotografias acordam velhas recordações
e te vejo,
no mesmo banco da praça naquele momento
em que passavam as crianças e os casais.
Enquanto, o músico tocava
e o casal se abraçava
rindo…
Lembro o misto, aquela composição que nas Quintas-feiras levava pessoas e cargas para o leste, às 13:15. Você lembra?
Partir nunca foi o momento mais alegre da vida, mas aquele momento era especial.
Sandrinha, vestida de verde, acenava e deixava nos lindos lábios o mais belo sorriso.
Então, o trem seguia, rumo ao leste.
Constante.
Trilhos, pedras, paisagens secas às margens de um rio e antigas pequenas cidades às margens da ferrovia.
As pessoas que viam o passar do trem, acenavam ao maquinista que respondia com risos, longos e estrondosos apitos, daquela buzina escandalosa.
Crianças viam heróis. Moças viam paixões e aventuras, mas dentro da composição, as pessoas esqueciam de contemplar o tempo que agora era disponível e também as histórias ao redor, estavam ocupadas com a pressa.
Então decidi voltar novamente a minha atenção ao mundo lá fora.
E vi o por do sol.
Montanhas, descidas incrivelmente lindas e assustadoras anunciavam a chegada a Contendas do Sincorá.
Era noite, as pessoas corriam para receber parentes, para vender seus produtos e outras para embarcar.
As horas passavam e a velha cidade ficava pra trás.
Trilhos, pedras, montanhas e novas paisagens.
A saudade e a despedida
Até o bendito trem resolver descarrilar… e longas três se passaram.
As queixas não eram tão interessantes…
Reclamações, queixas, um reggae no toca-fitas do Nilson e a expectativa ansiosa.
E chegamos, madrugada de Sexta. Brumado estava quente.
Dois dias, passaram como segundos e hoje, não lembro absolutamente nada do que aconteceu neste período – são longos 37 anos… mas lembro de querer voltar e ver novamente aquele sorriso, o sorriso de Sandra.
E depois dos trilhos, das pedras, das velhas cidades, eu estava de volta.
E ela estava lá, de blusinha verde, de short vermelho e de riso nos lábios.
Rindo, brincando e a dizer: ” Agora é a minha hora de partir…”
E de longe, vi o carro, estradas para o Sul… montanhas…céus… não consegui sorrir.
Havia uma barraquinha próxima ao muro da igrejinha, na praça que hoje é conhecida como a Praça dos Ferroviários. Era o ponto de encontro dos velhos seresteiros!
Chegavam aos poucos, cada um trazendo o seu próprio instrumento: violões, pandeiros, cavaquinhos… e enquanto a cidade se preparava para dormir, a melodia ditava o ritmo dos sonhos.
Ser menino era meio complicado.
Eu ficava à distância, sentado à porta da minha casa, observando cuidadosamente a entonação e decorando quase todo o repertório.
A “Morena Bela do Rio Vermelho” se envaidecia, mas não podia ouvir o clamor de “Fica comigo esta noite” ou a angústia apaixonada de “Onde estás agora?”
Seu Júlio puxava o coro: “Hoje que a noite está calma…” e, num Sol Maior perfeito, as vozes se encaixavam, dando à noite a impressão de harmonia entre lua, estrelas e apaixonados.
“Maria Helena” era a verbena daquela noite. “Meu Grito” era a oportunidade de desabafar entre “Os Verdes Campos da Minha Terra”. Às vezes, os músicos cansavam. Então, Seu Júlio, amigavelmente, trazia água para os amigos.
Prontinhos, agora hidratados, voltavam risonhos e com muito mais empolgação e emoção para cantar.
Entre “Negue”, “Ronda” e “Vou Sair Para Buscar Você”, chegava a hora de partir. E cantavam “A Volta do Boêmio”.
Era uma reunião de amigos.
Era um show de amigos para amigos.
O Fim de Uma Era
Esses encontros aconteciam apenas nos finais de ano. A cada ano, porém, o número de velhos amigos da serenata diminuía.
Eram quase trinta no início. No último encontro que pude contemplar, restavam apenas seis.
Músicos passam. Músicos morrem.
Por fim, Seu Júlio também faleceu. As serenatas acabaram.
A barraca foi demolida e, em seu lugar, construíram uma linda pracinha. Não há marcas ou lembranças daquele terreno onde a velha barraca resistia entre velhos arames.
Novos e belos músicos nasceram, mas jamais saberão o que era sentar entre amigos, rir das próprias falhas, cantar no mesmo tom sem competir. Eles não compreenderão como é bom cantar junto, dividir o prestígio, a emoção, o momento. Assim como deve ser a arte.
A Celebração da Amizade
Talvez a lua não provoque mais a mesma emoção. As pessoas mudam com o tempo e podem pensar que seria tolice cantar sob noites enluaradas.
Mas os seresteiros sabiam: não era a lua em si. Era a celebração da amizade, do amor, em belas e antigas canções. Eles sabiam que um dia tudo aquilo passaria e, por isso, precisavam se encontrar. A lua era apenas um pretexto.
Que os novos amigos encontrem sempre um motivo para se reunir, para celebrar. A vida passa.
Hoje, depois de tanto tempo, me pergunto: “Os velhos, incansáveis seresteiros quase não paravam. O que será que tinha naquela água que Seu Júlio servia?
“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo Perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto, Que, para ouvi-las, muita vez desperto E abro as janelas, pálido de espanto…
E conversamos toda a noite, enquanto A via-láctea, como um pálio aberto, Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto, Inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: “Tresloucado amigo! Que conversas com elas? Que sentido Tem o que dizem, quando estão contigo?”
E eu vos direi: “Amai para entendê-las! Pois só quem ama pode ter ouvido Capaz de ouvir e de entender estrelas.”
(Poesias, Via-Láctea, 1888.)
Olavo Bilac
Comentando a poesia
Esse é um dos sonetos mais belos e conhecidos de Olavo Bilac, extraído do livro Via Láctea (1888).
Este soneto carrega a essência do Parnasianismo na forma impecável e no rigor métrico, mas também transborda lirismo e subjetividade, flertando com o Simbolismo.
Aqui, Bilac constrói uma metáfora poderosa sobre a sensibilidade e a capacidade de perceber a beleza e o mistério do universo.
O eu lírico enfrenta a incredulidade daqueles que não compreendem sua comunhão com as estrelas, representando a oposição entre razão e emoção, lógica e sentimento.
Ao que a resposta final—”Amai para entendê-las!”—é um convite à sensibilidade, sugerindo que só através do amor é possível captar o que é invisível aos olhos e inalcançável pelo intelecto frio.
Sim, essa ideia de que o amor é a chave para compreender o sublime é profundamente tocante.
O poema sugere que há mistérios no mundo—representados pelas estrelas—que a razão sozinha não pode desvendar. Só quem sente profundamente, quem ama, pode realmente “ouvir” e entender essas verdades mais sutis.
Melancolia e Solidão
Além disso, há algo de melancólico e solitário no eu lírico, que passa a noite em vigília, encantado com as estrelas, mas também enfrentando a incompreensão dos outros. Esse contraste entre a frieza da razão e o calor da emoção torna a mensagem ainda mais envolvente.
A superficialidade e a pressa da vida moderna tornam essa contemplação cada vez mais rara.
Parece haver uma desconexão entre o sentir e o viver, como se as pessoas estivessem sempre correndo atrás de algo—sucesso, status, prazer imediato—mas sem realmente se permitirem sentir com profundidade.
O amor, como Bilac sugere, não é apenas um impulso ou um desejo, mas uma forma de percepção. Ele nos dá um olhar mais sensível sobre o mundo, nos permite “ouvir estrelas”, ver a beleza onde outros veem apenas o banal.
Cabe a seguinte reflexão: “Será que ainda há espaço para esse tipo de sensibilidade no mundo de hoje? “
Olavo Bilac (Olavo Braz Martins dos Guimarães Bilac -1865-1918 ), foi um dos maiores poetas do Brasil, principal nome do parnasianismo, e um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras, criou a cadeira nº. 15, que tem como patrono Gonçalves Dias. – Olavo Bilac | Academia Brasileira de Letras
Sua atuação não se restringiu à literatura, destacando-se também pelo forte engajamento cívico e político. Defensor do serviço militar obrigatório, escreveu a letra do Hino à Bandeira e fez oposição ferrenha ao governo de Floriano Peixoto, chegando a ser preso em 1891.
Desde jovem, Bilac mostrou talento para as letras. Ingressou na faculdade de Medicina por influência do pai, mas abandonou o curso para se dedicar ao jornalismo e à literatura. Trabalhou em diversos periódicos e publicou seu primeiro soneto, Sesta de Nero, em 1884, recebendo elogios de Artur Azevedo.
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Em 1907, foi eleito “Príncipe dos Poetas Brasileiros” pela revista Fon-Fon.
Frequentador de rodas literárias e boêmias no Rio de Janeiro, Bilac teve uma vida social intensa. Ocupou cargos públicos e dedicou-se à produção de poemas, crônicas, livros escolares e até textos publicitários.
Curiosidade: Em 1897, sofreu o primeiro acidente automobilístico registrado no Brasil.
Bilac viveu sozinho, após dois noivados desfeitos, e faleceu em 1918, vítima de edema pulmonar e insuficiência cardíaca. Sua influência no cenário literário e cívico é eterna, imortalizando-o como um dos grandes nomes da poesia brasileira.
Explicando o Parnasianismo
O parnasianismo foi uma escola literária surgida na França, no século XIX, como uma reação ao sentimentalismo e subjetividade do romantismo. Caracterizou-se pelo rigor formal, objetividade e busca da perfeição estética na poesia.
Os parnasianos valorizavam a métrica rígida, as rimas ricas e a linguagem refinada, muitas vezes explorando temas clássicos e mitológicos.
A poesia parnasiana enfatizava a arte pela arte, ou seja, o compromisso maior era com a estética, e não com emoções ou engajamentos sociais.
Eu não sabia que seria aquela a última vez que iria te ver
Chovia
O baile que começaria às oito, achava que provavelmente seria adiado
pois a eletricidade em nossa pequena cidade não tem um bom relacionamento com qualquer tipo de chuva
A escuridão queria um pouco mais de espaço
Imaginei…
Ela não deve vir…
Os sapatos e o vestido brancos
E o laço vermelho nos cabelos…
Não queria imaginar os teus olhos
A chuva ficava ainda mais forte
E ainda assim o baile começava
E a banda começava a tocar aquela música
Lá dentro os pares, já não sentiam medo
Dançavam
Deslizavam pelo salão
E eu te imaginava …
Confesso, não estava desapontado
Nem todos tinham carro naquele tempo…
E quanto a mim… nem bicicleta!
Mas, não queria que a chuva fria te molhasse
E a música continuava
E na chuva resolvi dançar sozinho, na chuva
Girava…
Escorregava na rua lisa
De olhos fechados
Aproveitava a festa sozinho
Lá mesmo, lá fora, na chuva
E antes mesmo de a música acabar
abria os meus olhos,
E lá estavas tu…
Me olhando
Sorrindo
De rostinho molhado
De vestido molhado
De sapatinhos molhados…
E de repente, te estenderia a minha mão
E vinhas…
E lá, sob a chuva
Mas, sobre as nuvens
dançávamos… até o fim