Gilson Cruz
NO INÍCIO, AS PERNAS TREMIAM
As pernas tremiam quando ela entrava na sala de aula.
Ele não sabia, mas talvez a adolescência ainda existisse, embora disfarçada, atrás das lentes daqueles óculos para corrigir um pouco daquela miopia.
As “quintas-feiras” de Primavera, eram terríveis!
Ele tinha que suportar, já na aula de entrada a voz doce daquela – que em qualquer outro lugar, seria uma jovem linda, uma paixão e que naquela hora era nada menos que a sua professora.
As aulas eram chatas, a voz dela era doce, mas ela vivia insistindo para que ele desse mais atenção às aulas.
O misto de emoções parecia irreal.
No outono, acontecem as paixões, diziam os colegas em tom de brincadeira entre as aulas de histórias, ciências e biologia.
Mas, não é que havia um pouco de verdade?
Alunos se apaixonarem por professores, não era tão incomum.
Ele era tímido, introvertido, mas para ela, ele criava seus melhores versos, inventava novas canções – e sonhava com o momento de mostrá-las – ainda que sabendo, lá no fundo, que não haveria chance alguma de algo acontecer.
E O FIM DE MAIS UM ANO
E as aulas continuaram, o inverno passou, as brincadeiras juvenis se tornavam menos intensas e depois de longos meses, chegaria a hora de se despedir daquela turma, daquela escola e dela, a razão dos versos.
Abraços, adeus…todos contentes.
Emanuel, seu melhor amigo, abraçaria a História, Romualdo se dedicaria a Educação Física, Cida iria para o Sul, Dalva para a França… todos caminhariam em estradas diferentes.
Melhores amigos se despediam e prometiam sempre enviar notícias – mas, a vida prega essas peças.
Alguns foram para longe e o tempo não lhes permitiu enviar as esperadas lembranças, notícias…
Outros se foram, pois os imprevistos acontecem mesmo aos jovens… não tiveram tempo de dar um último abraço, como o Augusto que desistiu de viver, e que jamais fora entendido por alguém.
Mas, naquele momento de despedidas, sentia a falta da jovem Professora.
Estava num misto de alegria e tristeza por se despedir, por ver mais um fim de ano.
E ELE DECIDE APRESENTAR SEUS VERSOS…
Estava livre agora para conversar com aquela que fora a inspiração das músicas e poemas.
E ainda, na última Sexta-feira, de um Dezembro qualquer, ele organizava seus versos…
Ensaiava suas últimas canções.
Se preparava apenas para um muito obrigado, ainda que meramente formal… e poder se desiludir, então.
E naquela noite, logo após a lua brilhante do novo verão iluminar o leste da cidade, apanhou seu violão e se dirigia, caminhando pelos trilhos até o caminho que levavam à porta mais distante do mundo.
Cada passo pesava toneladas e cada segundo eram séculos vividos até a esquina que dava na rua das Rosas.
E cruzando a esquina, vira de longe um carro.
E do carro descia aquele que falava as palavras que ele desejava falar, e planejar o futuro que ele sonhou por todo um ano…
No momento em que ele chegava, seus olhinhos verdes brilhavam e seus lábios riam enquanto andava alegremente para abraçá-lo.
Abraçar aquele a quem ela amava e de quem certamente ouviria as palavras, que ela desejava ouvir.
Olhando à distância, ele desiludido, via a razão dos seus versos também entrar no carro e saírem.
Não houve lágrimas. E o caminho de volta se tornara longo…
A lua agora iluminava as suas costas e o velho Di Giorgio tinha o peso do mundo.
Naquela noite não haveria músicas ou poemas, até porque num tropeço, o braço do seu violão favorito, se quebrava em dois.
Desempregado, não podia comprar outro…ser jovem, era outro nível!
As músicas cessaram naqueles dias.
E um novo ano se aproximava.
Haveria novas turmas, novos professores e diferentes paixões.
E a vida continuaria. Ele certamente encontraria alguém e amaria, e quem sabe voltaria a escrever novos versos…
Mas, ainda lembraria daquele violão, que o acompanhava nas madrugadas de composições para a sua paixão adolescente, e daqueles meses e sentimentos, que findariam também. No fim das aulas – num verão.
Veja também Caminhos de ferro ( Um conto) ‣ Jeito de ver