GChaves
Reflexões no trajeto urbano
Sempre a passeio pelas ruas da cidade, contemplando momentos de descontração e reduzindo obrigatoriamente a velocidade no trajeto urbano (devido aos quebra-molas), os pensamentos fluíam em uma concentração necessária. Talvez, assim, o estresse e a ansiedade diminuíssem, proporcionando àquela mente inquieta um pouco de alívio.
Porém, num certo dia, enquanto seguia o mesmo caminho, algo chamou a atenção. Uma cena, aparentemente familiar, repetia-se.
O senhor do tempo
No passeio de uma humilde residência, lá estava ele!
Um senhor que imediatamente capturou o olhar. Sentado com o olhar fixo no vazio do tempo, suas pernas cruzadas, jeans surrado, camisa de mangas compridas, sandálias Havaianas pretas e um relógio — talvez um Oriente — compunham sua figura serena.
Era perceptível que ele pertencia àquela humilde residência e ao mesmo tempo transcendia o lugar, perdido em pensamentos que só ele compreendia. A imobilidade daquele corpo contrastava com a intensidade de sua mente, que parecia viajar para lugares desconhecidos.
Seu semblante carregava o cansaço de um passado que provavelmente o marcara profundamente. A pele enrugada revelava o tempo vivido, enquanto a falta de expectativas no olhar sugeria que ele aceitara o ritmo lento e descompromissado dos dias. Era como se o senhor e o tempo compartilhassem o mesmo espaço vazio e sem pressa de avançar.
A companhia inesperada
Dias depois, em outro passeio pela cidade, o cenário se repetiu — mas com um detalhe novo e surpreendente.
Era um dia chuvoso, com chuviscos escorrendo pelo para-brisa. E lá estava ele novamente, sentado na mesma posição serena, como se nada pudesse perturbar sua paz.
Dessa vez, porém, havia um companheiro: um cão vira-lata de pelagem branca com manchas pretas — ou preta com manchas brancas, isso pouco importava. O que realmente fazia diferença era o vínculo entre o homem e o animal. Sob as gotas de chuva, enquanto o senhor olhava para o vazio do tempo, o cão deitava-se ao seu lado, compartilhando o momento de calma e silêncio.
Parecia que o homem, envolto em suas realidades internas, havia encontrado em seu fiel amigo uma presença que o conectava ao mundo exterior. Uma parceria simples, mas carregada de significado.
O que virá depois?
Certamente, ao passar novamente por aquela rua, a cena se repetirá: o senhor no mesmo lugar e talvez seu companheiro ao lado.
E, quem sabe, o observador ansioso e estressado tomará coragem para se aproximar, descobrir um pouco mais daquela mente que tanto despertou sua curiosidade, e aprender algo sobre a quietude que tanto busca.
Gilmar Chaves 21/05/2023
Gilmar Chaves, Professor, Poeta, Conselheiro e membro da formação inicial da Banda Experiência. A arte de observar e fazer parte da história.
Veja mais em: O tempo ( Contador de histórias) – Jeito de ver.