
Roupa Nova
Roupa Nova: Trilha Sonora de uma Vida
“Todos os dias, todas manhã
Sorriso aberto e Roupa Nova…”
— Roupa Nova, Milton Nascimento
Falar sobre o grupo Roupa Nova é como abrir o velho baú das memórias. Não é apenas música — é infância, juventude e afeto embalados em canções.
Talvez eu não seja a melhor pessoa do mundo para contar a biografia do Roupa Nova, pois falar do grupo Roupa Nova é estranho — é como revisitar a minha infância.
Relembrar as dificuldades para ir à escola no início dos anos 1980, quando, infelizmente, muitas instituições de ensino estavam em estado de abandono, reflexo da negligência de um governo autoritário que não valorizava a educação.
A situação era tão crítica que a escola Arquiteto Raul Cajado teve, intencionalmente, uma de suas letras trocadas para formar um trocadilho digno de processos…
Na cidadezinha em que eu morava, todos os prédios escolares estavam arruinados naquele início de década.
Nesse ambiente de descaso, as harmonias perfeitas e as músicas animadas do Roupa Nova acompanhavam meus passos rumo aos prédios que pareciam cenário de filme de guerra.
Em casa, a velha televisão valvulada da marca Colorado — preto e branco — ocupava a sala de estar.
Nos fins de semana, programas musicais e os rádios traziam as novidades.
As canções do grupo davam mais leveza aos novos dias.
Os Famks, os Motokas…
Mas a história deles era bem mais antiga do que eu imaginava.
Tudo tinha começado lá atrás, nos anos 1960, quando ainda não existia o Roupa Nova.
Em 1967, nascia o grupo Os Famks, no Rio de Janeiro.
Animavam festas e bailes, mas ainda não contavam com os integrantes que viriam pra encantar.
Foi só nos anos 1970 que os caminhos desses seis músicos se cruzaram de vez: Paulinho, Serginho Herval, Nando, Kiko, Cleberson Horsth e Ricardo Feghali.
Ainda como Os Famks, lançaram dois discos e, por um tempo, usaram o nome Os Motokas para gravar versões de sucessos internacionais.
Mas a virada veio no final da década.
Surge então o Roupa Nova.
A banda assinou com a gravadora Polygram e decidiu investir num som próprio.
Roupa Nova
O nome Roupa Nova foi inspirado em uma canção de Milton Nascimento e Fernando Brant, que gravaram em 1980.
O rádio tocava Sapato Velho…
Minha cabeça de menino não compreendia bem o significado, mas meu coração sentia algo diferente.

Roupa Nova
A música me inspirava a viver grandes coisas, mesmo sem entender direito.
Com o tempo, percebi: ela falava da passagem dos anos, das experiências e de um amor que não envelhece.
Ainda hoje, com cinquenta e poucos, ouço e me emociono.
A Canção de Verão era febre nas rádios.
Tentava seguir o contrabaixo do Nando — meu baixista favorito, mas neste grupo todos eram favoritos!
Na minha meninice, sonhava em assistir a um show daqueles que me acompanhavam nas manhãs escolares.
Aquela trilha sonora deixava tudo mais bonito.
A década de 1980 foi um estouro.
Era difícil escolher uma melhor música: Clarear, Lumiar, Vira de Lado, Voo Livre, Bem Simples, Anjo, Boa Viagem, Fora do Ar, Sensual, Chuva de Prata, Tímida e Não Dá. Whisky a Go Go virou clássico, tema de abertura da novela Um Sonho a Mais, junto com Chuva de Prata, num dueto com Gal Costa.
Lembro que, em todo baile que eu ia, havia uma regra: a banda tinha que tocar Whisky a Go Go.
Anos depois, senti a emoção do público ao tocá-la nas festas em que pude me apresentar.
Mas pra mim, tudo era Lumiar e Voo Livre.
Com o início da adolescência, as harmonias me arrepiavam a espinha.
Meus amigos curtiam as mais agitadas, mas eu… era das baladas românticas.
Em 1985, mais sucessos…
A banda lançou o disco mais vendido da carreira: mais de dois milhões de cópias!
A minha quinta série teve como trilha sonora Dona (tema de Roque Santeiro), Seguindo no Trem Azul, Linda Demais, Sonho, Corações Psicodélicos e Show de Rock’n Roll, que tocavam durante os vinte minutos de intervalo na escola.
As paixões aconteciam, e talvez por isso eu fosse mais chegado às músicas românticas.
Nos anos seguintes, eles continuaram firmes.
Vieram com Um Sonho a Dois (com Joanna), Volta Pra Mim, A Força do Amor, Cristina, De Volta Pro Futuro, Meu Universo É Você e Vício.
Em 1989, ainda com gás, gravaram Eu e Você com José Augusto, tema da novela Tieta, parceria perfeita!
Anos 90 – Adolescência, paixões e músicas
Na década seguinte, os tempos de menino ficaram pra trás.
Gostava de cantar a música Cristina, que foi lançada em 1987… sonhava tocar o projeto de minha banda, mas a vida nem sempre segue o curso desejado.
Aos 22 anos, passei a trabalhar em uma escola — de poucos recursos, mas diferente daquelas do início da década anterior — breve carreira de professor.
Lembro de um aluno de seis anos que me perguntou: “Professor, o senhor gosta do Roupa Nova?”
Mas… a resposta era óbvia demais!
Expliquei ao pequenino que, desde bem menino, colecionava discos e fitas do grupo.
Fui presenteado com a Fita K-7 Frente e Versos.
O álbum trazia sucessos como Coração Pirata, tema de Rainha da Sucata.
Trazia também uma linda versão de Yesterday, dos Beatles, e parcerias ousadas como Esse Tal de Repi Enroll, com o grupo americano The Commodores.
Eu era apaixonado por Cartas.
Em 1991, lançaram o primeiro álbum ao vivo, revisitando clássicos como Lumiar, Anjo, Linda Demais, Volta Pra Mim, Clarear, entre outras. Duas faixas inéditas viraram trilha de novela: Felicidade e Começo, Meio e Fim, que marcaram a novela Felicidade, da Globo.
Aquele ano trouxe também um momento simbólico: a banda subiu ao palco do Rock in Rio!
Releituras
Eles revisitaram seus sucessos e dividiram Todo Azul do Mar com Beto Guedes.
Uma das mais belas canções, numa nova roupagem!
Em 1993, veio De Volta ao Começo, só com releituras de clássicos da MPB.
Tinha Gonzaguinha, Roberto Carlos, Os Mutantes, Milton Nascimento…
Destaques para De Volta ao Começo (tema de Renascer), Ando Meio Desligado (tema de Sonho Meu) e Maria Maria, que só virou trilha de novela anos depois, em 2007 (Caminhos do Coração).
Em 1994, lançaram Vida Vida, com a inesquecível A Viagem, tema da novela de mesmo nome. Ficou meses entre as mais tocadas.
Tinha também Os Corações Não São Iguais (que virou hit com outros artistas), Louca Paixão e Coração Aberto.
Em 1995, lançaram uma coletânea de trilhas de novelas, incluindo Ibiza Dance — tema instrumental de Explode Coração, que até ganhou remix.
Poderia contar ainda mais. Mas seria como tentar resumir o tempo.
Resumo de uma Vida
As canções que me acompanhavam desde a infância receberam novas músicas para a trilha da minha adolescência…
Sim, é verdade, muito mais eu poderia falar sobre discografia, biografias, a sentida perda do Paulinho… muitas coisas, mas, assim como as suas canções, gostaria de deixar algo de bom.
A banda mantém o ritmo com Fábio Nestares, músico experiente e carismático, mantendo aquilo que sempre foi o foco da banda: fazer música de qualidade, boa de ouvir.
Apesar da superficialidade dos streamings, independentemente das constantes mudanças no mercado musical, Roupa Nova sempre está presente. Com músicas de qualidade!
Roupa Nova é isso: trilha da vida de muita gente.
Deu voz às minhas primeiras paixões, me acompanhou nos tempos de escola, virou canção de ninar para minha filha e, hoje, com a minha família, é a trilha sonora dos nossos melhores dias.
Infelizmente, nas mudanças da vida, a minha coleção de vinil ficou no passado, não consegui preservar.
Mas, falar de Roupa Nova é falar de emoção, de vida.
E, pra quem viveu tudo isso — ou está conhecendo agora — é impossível não sentir um aperto no peito e um sorriso no rosto quando toca uma daquelas canções.
Os eternos meninos Paulinho, Serginho Herval, Nando, Kiko, Cleberson Horsth, Ricardo Feghali e Fábio são parte da história.
Roupa Nova é memória viva. É a trilha sonora da minha vida.
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