Sabe aquele tipo de pessoa que parece impossível de esquecer?
Sim, essas pessoas existem!
Quando eu ainda era jovem (e isso já faz muito, mas muito tempo!), lembro de um período de depressão.
Era um tempo de perdas, de afastamento da família e, sinceramente, eu não sabia o que fazer…
Morava na cidade da minha paixão, um pequeno município chamado Santa Terezinha, no interior da Bahia.
Silêncio e amizade
A cidade era pequena, acho que ainda é. A praça tinha grandes árvores, o vento adorava soprar no meu telhado, eu tinha medo dos raios e trovões, e um escorpião resolveu me picar só para me lembrar que eu não estava sozinho no mundo… Ah, e a dengue também me pegou duas vezes, de jeito!
Mas o povo era amável, e os dias eram bem ocupados.
Sim, os dias eram ocupados. Trabalhava o dia inteiro e, sendo jovem, não tinha muitos amigos.
Até que, num desses meses de junho, recebi a notícia de que uma das melhores pessoas que conheci, que amava de coração, havia falecido em seus vinte e poucos anos…
Confesso que não queria ter amigos por perto! E, até hoje, não sei por quê.
E então, num desses dias, ele aparece.
Me convida para passar em sua casa.
E, na maior simplicidade, me apresenta algo que um péssimo guitarrista como eu só tinha visto a centenas de quilômetros de distância. Não resisti à tentação. Lembro do espanto:
“Rapaz, que arsenal!”
Mesas de som, caixas, microfones, guitarras, baixo, teclado… Ele sabia que eu cantava razoavelmente mal, mas fazia questão de que eu cantasse!
Ele não dava conselhos, apenas respeitava o silêncio, a dor… E, quando podia, me ajudava a desabafar com aquilo que me agradava.
É engraçado como hoje tenho mais ou menos a mesma idade que ele tinha naquela época… E percebo quanto sofrimento devia ser para aquele sujeito de bom ouvido escutar um moleque tão desafinado!
Mas ele escutava, escutava, escutava…
As memórias que ficaram
Anos mais tarde, encontrei uma daquelas fitas que ele costumava gravar.
Numa das faixas, ele tocava suavemente um piano elétrico — talvez num Dm (Ré menor), não lembro mais —, enquanto eu, com uma guitarra Giannini Craviola, fazia o possível para não estrangular a música…
E a música fluía, entre gargalhadas e brincadeiras.
E ele soltava a voz…
A voz mais tranquila e afinada…
Que gostava de rir…
E que se calava quando o silêncio ajudava.
Ah, antes que eu me esqueça: estraguei a música, como de costume… mas só um pouco!
Uma melodia inesquecível
Hoje, um tanto mais velho e com a audição comprometida, consigo ouvir em meu coração cada nota, cada palavra… cada silêncio daquela pessoa, daquele amigo lá da minha juventude.
É bom ter pessoas que não esquecemos. Essa é, sem dúvida, a mais bela voz que pode existir.
Ao meu amigo e irmão,
Rogério Alves.
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