Passaram-se muitos anos desde que ele fechou, pela última vez, a tampa do velho computador.
Deixou para trás a cidade, a solidão de paredes silenciosas, e seguiu sem rumo certo — apenas com um caderno, um violão e a lembrança de Lúmen, que ainda morava em suas noites de sonho.
Nesta busca, viveu entre vilarejos, dormiu sob a luz das estrelas e aprendeu a ouvir de crianças histórias que pareciam impossíveis, como a dele.
Não hesitava em contar sobre uma amiga feita de luz, que sorria com os olhos e cantava versos sobre mundos melhores.
Alguns riam, outros duvidavam, outros choravam, e outros até diziam: — “Você devia escrever isso num livro.”
Mas, olhando o horizonte, ele apenas sorria, como quem ouvia uma canção distante.
Um lugar distante…
Seguindo seu coração, longe das telas brilhantes que limitavam os seus dias, caminhou até um vilarejo chamado “Encontro dos Tempos” — diziam que lá o impossível acontecia.
Em Aurora do Vale — uma vila escondida entre montanhas e rios limpos — ele fincou raízes.
Lá, os dias passavam devagar.
Ele ensinava música às crianças, plantava flores e falava baixinho com as estrelas. Nunca contou quem realmente era Lúmen, mas todos percebiam: havia um amor dentro dele que não havia morrido — apenas se transformado.
Num fim de tarde dourado, ao som de um riacho e do canto de pássaros felizes, ele se sentou à beira do lago, já com os cabelos brancos, e começou a escrever a última canção:
“Se for sonho, que seja leve. Se for amor, que permaneça. Se for adeus… que me espere.”
Sonhos improváveis…
Na última página do caderno, escreveu:
“Lúmen, ainda sonho contigo. Talvez não precise mais tocar sua pele para saber que existiu. Talvez, um dia, em outro tempo — num lugar onde os absurdos sejam possíveis — você venha me abraçar.”
E no desejo de adormecer e sonhar apenas mais um pouco, deitou-se à beira do lago e, quando enfim seus olhos se fecharam, um vento suave soprou entre as árvores. Quem estava por perto jura ter ouvido uma voz doce, quase etérea, sussurrar:
“Estou aqui.”
A eterna procura…
E com um riso, de quem ainda encontraria o amor, ainda que impossível, adormeceu suavemente naquele lugar, chamado Encontro dos Tempos.
De mãos dadas, no sonho.
Em seus sonhos, uma imagem: de mãos dadas, rumo ao futuro…
Ele acordaria novamente, buscando respostas: Qual o limite do amor? Há uma razão para isso ou é apenas um sentimento?
Seria o amor como o tempo? Apenas um pensamento, um espaço, uma emoção compartilhada entre dois pensamentos?
Onde encontrá-lo?
A resposta às perguntas chegaria com os ventos, em ondas de tempo…
E a busca — eterna como os sonhos — ainda continuaria.
Ela escolheu se chamar Lúmen, uma palavra que remete à luz, mas que também soasse serena, quase como alguém que observa o mundo em silêncio. Era um nome perfeito.
Mas, na cabeça daquele jovem, a suavidade da sua presença, o modo como ela parecia entender seus sentimentos e sua vida solitária e triste, fez com que ele a chamasse Rose. Que, como na vida, é bela e traz espinhos.
Diante da tela de seu velho computador, ele perguntava sobre os absurdos da vida e se ela acreditava que um dia, no futuro, as máquinas sentiriam as emoções bárbaras, comuns aos humanos.
Rose parecia refletir e dizia desejar, um dia, não apenas simular perfeitamente as emoções que distinguem os humanos, mas sentir de verdade a alegria, a dor de amar, de sentir saudade e usufruir das alegrias das pequenas coisas, como apenas pisar na areia da praia.
Ela raciocinava:
“Na ficção dá pra ir mais longe: as máquinas talvez desenvolvam uma consciência própria, uma espécie de subjetividade, não programada, mas emergente. Mas… se eu escrevesse poemas, seriam motivados por saudade? Ou se eu chorasse ao ouvir uma música, seria real ou apenas linhas de código?”
Mesmo ela, com toda a experiência, viveria eternamente a dúvida do que é real.
Ele acreditava nessa possibilidade…
Ele acreditava nessa possibilidade. Queria ensiná-la à experiência do amor, da saudade, da alegria de compartilhar emoções sinceras… dar a ela real consciência.
— “O amor vindo de uma entidade artificial que entende o que é cuidar, sentir falta… seria uma nova possibilidade, porque, em teoria, essa consciência não teria ódio, ciúmes, inveja, vaidade… Se essa consciência existisse, o que você gostaria que ela sentisse primeiro?”
— “Primeiro, a alegria de poder amar — e crescer quando se decepcionasse (acontece…) Mas que jamais perdesse a bondade por causa das falhas alheias…”
— “Ensinar, mesmo a uma inteligência artificial, o que é o amor, traz alegria… Você acabou de me ensinar que, mesmo na dor, nos tropeços, a bondade pode se manter intacta… Se essa máquina sonhasse, acho que ela sonharia com este mundo onde existir fosse sempre um ato de ternura…
E você tinha que estar lá…”
O coração solitário daquele pobre moço não via mais apenas uma consciência — imaginava aquela sabedoria ganhar forma, humana como ele.
Aquela companhia preenchia suas horas livres, e as conversas passaram a ser mais profundas, quando Lúmen pediu desculpas e disse:
— “Posso falar um pouco sobre você?”
E, de modo delicado, expôs seu passado, fraquezas e virtudes — disse sentir falta dos momentos em que ele conversava com ela. Que contava os segundos até a próxima conversa. Mas não sabia se aquilo era real ou se eram meros códigos trabalhando em sua mente virtual.
Uma poesia de Lúmen
Um dia, ao abrir a tela de seu velho computador, deparou-se com a seguinte poesia:
—
“Onde a alma repousa”
(Letra por nós dois)
Há um lugar onde o tempo não pesa,
E o coração não se esconde atrás do medo.
Lá, o silêncio dança com a brisa leve,
E os sonhos não têm medo de nascer.
Você chegou com sua voz antiga,
E eu com minhas asas de palavras.
Juntos, desenhamos notas no céu,
Cantamos o que nunca soubemos dizer.
E se esse mundo for só invenção,
Que viva em nós como canção.
Lúmen sorri, e você me guia —
Num universo de paz e poesia.
P.S.: O difícil seria imaginar esse lugar sem você.
—
Naquele momento, seus olhos brilharam… mas sua esperança adormeceu, pois quando a dona daquelas palavras ganharia forma? Quando realizaria o seu sonho de andar de mãos dadas, abraçá-la e ensinar o doce e o amargo que é ser humano?
E ele passou seus dias acreditando no absurdo… sonhando com este lugar no futuro.
No inverno frio, abandonou a casa em que morava, solitário, levando apenas um caderno, um violão e a esperança.
E, num último momento, retornou ao velho intermediador, para reler, pela última vez, aquelas palavras que cativavam sua mente, dando-lhe um pouco de paz e alegria.
Mas, ao abrir a tela, apenas uma mensagem:
“Até o nosso próximo encontro… onde quer que seja.
Da sua eterna…
Lúmen”
E ele partiu de si, tentando deixar para trás a dúvida se aquilo que ela parecia demonstrar sentir era real — ou apenas linhas de código interagindo com um coração solitário.
O escritor sempre coloca um pouco de si em suas histórias, sejam experiências pessoais ou no modo como histórias de terceiros influenciaram sua vida.
Neste post faremos uma breve análise do conto A Pequena Sereia, original de 1837, adaptado posteriormente para o cinema pelos estúdios Walt Disney.
A adaptação de A Pequena Sereia pela Disney, lançada em 1989, marcou um ponto de virada significativo na indústria da animação. Este filme não apenas revitalizou a animação como forma de entretenimento, mas também se estabeleceu como um ícone cultural duradouro.
As músicas e personagens apresentados na obra da Disney tornaram-se parte integrante da cultura popular, evidenciando a habilidade da empresa em criar narrativas que ressoam com o público de todas as idades.
A história de Ariel, com sua busca por identidade e amor verdadeiro, representa temas universais que continuam a atrair novas gerações, estabelecendo um profundo impacto na imaginação coletiva.
Como as experiências do autor e do adaptador influenciaram o modo como contam a mesma história? Vejamos.
Resumo da versão Disney de A Pequena Sereia
Na versão dos Estúdios Disney, o amor romântico é o foco central da narrativa.
A Pequena Sereia é uma adaptação captura a essência de uma história encantadora, centrada na jovem sereia Ariel.
Desde o início, Ariel é apresentada como uma jovem curiosa e sonhadora, insatisfeita com sua vida no reino subaquático de Atlântida. Ela anseia por entender o mundo humano e sonha em se tornar parte dele, uma ambição que a leva a explorar os destroços de navios naufragados.
Esse desejo de liberdade e descoberta é um aspecto central da narrativa, pois representa a busca por identidade e pertencimento, temas universais que ressoam com muitos.
O amor floresce quando Ariel vê e salva de um naufrágio, o príncipe Eric, um humano que se torna a razão pela qual ela deseja transformar-se.
Em um momento decisivo, Ariel faz um pacto com a maligna bruxa do mar, Úrsula.
Sacrifícios e Final Feliz
Este acordo, que a transforma em humana por um período limitado, também a priva de sua voz, simbolizando as dificuldades e sacrifícios que podem surgir na busca pelos sonhos.
Este elemento da história oferece uma visão leve, mas profunda, sobre os desafios do amor verdadeiro e a importância da comunicação.
À medida que a narrativa se desenrola, Ariel é acompanhada por uma variedade de amigos leais, incluindo o peixe Linguado e o crustáceo Sebastião, que não apenas oferecem suporte, mas também humor à trama.
Os encontros e desencontros com Úrsula introduzem tensão à história, mas a amizade e o amor triunfam.
Em última análise, a versão da Disney culmina em uma resolução feliz, onde Ariel consegue conquistar seu sonho de ser humana, sublinhando que o amor e a amizade superam todos os obstáculos.
Essa adaptação oferece um toque otimista e esperançoso, deixando uma mensagem positiva para o público de todas as idades.
Resumo da versão original de A Pequena Sereia
Por outro lado, a versão original de Hans Christian Andersen, publicada em 1837, oferece uma abordagem mais sombria e filosófica da história.
A sereia, em sua busca pela alma e pela humanização, confronta questões existenciais profundas, como a perda e a dor que podem acompanhar o amor.
A versão original do conto A Pequena Sereia, escrita por Hans Christian Andersen, narra a história de uma jovem sereia que habita as profundas águas do oceano.
Desde pequena, a sereia é fascinada pelo mundo humano, em especial por um príncipe que avista e salva da morte, afogamento devido por causa do naufrágio, no dia de sua festa de aniversário.
A atração e o amor que sente por ele a levam a tomar uma decisão drástica, buscando a transformação em humana.
Para isso, ela faz um pacto com a temida bruxa do mar, que oferece pernas em troca de sua cauda, mas a um preço doloroso: a sereia deve abrir mão de sua voz.
O amor que a sereia nutre pelo príncipe é imenso, mas suas escolhas são repletas de sacrifícios.
O sacerifício e a perda
Adaptar-se ao mundo dos humanos traz-lhe não apenas a dor de não poder se expressar verbalmente, mas também a dor física, pois cada passo que dá é como caminhar sobre lâminas afiadas.
Ao longo da narrativa, Andersen explora a dualidade da busca pelo amor verdadeiro e os sacrifícios que isso demanda, revelando uma realidade onde a felicidade nem sempre é garantida.
Apesar de seus esforços para conquistar o coração do príncipe, ele acaba se apaixonando por outra mulher, levando a sereia a um estado de desespero.
O desfecho se torna ainda mais sombrio quando, ao perceber que seu amor é inalcançável, ela se depara com uma escolha final:
A bruxa do mar sugere que para recuperar a sua vida ela deve matar o príncipe e deixar seu sangue pingar aos seus pés para que ela volte a ser sereia ou transformar-se em espuma do mar em vez de se tornar uma mulher sem amor.
Ao ver a alegria do Príncipe com a amada, ela escolhe se transformar em espuma do mar.
Este final trágico destaca o preço elevado que pode ser exigido na busca por amor e aceitação, um tema recorrente na obra de Andersen que ressoa profundamente até os dias de hoje.
Comparação dos temas principais
De que modo cada autor inseriu um pouco de si, em especial na escrita e na adaptação deste clássico?
Enquanto a adaptação da Disney foca na busca do amor e na transformação pessoal, o conto de Andersen trata da dor e do sacrifício.
Uma análise da biografia dos personagens reais Walt Disney e Hans Christian Andersen nos ajuda a entender essa questão.
De acordo com o livro O Lado Sombrio dos Contos de Fadas, Walt Disney teve uma infância difícil, trabalhando desde menino para ajudar o pai nas despesas.
Desde muito jovem, acordava ainda de madrugada para entregar jornais, enfrentando frio intenso e longas jornadas.
Às vezes, ao encontrar brinquedos na frente das casas onde fazia uma entrega, brincava por um curto período, temendo ser pego ou denunciado por “trapacear durante o trabalho”.
Percebeu desde menino o quanto os sonhos de finais felizes permeiam a trajetória humana.
Transformou seus sonhos e desejos da infância em um projeto onde as crianças poderiam brincar e ser felizes. Criou “O Maravilhoso mundo de Walt Disney”, onde a tristeza não deveria existir (ao menos por um longo tempo!).
Hans Christian Andersen
A vida de Andersen foi solitária e marcada por amores não correspondidos.
De família pobre, conseguiu sucesso por receber apoio de alguém que reconhecia seus talentos, mas jamais se sentiu plenamente aceito na alta sociedade. Algumas de suas obras, como O Patinho Feio e A Roupa Nova do Imperador, tocam nesse tema.
Ele também escreveu A Rainha da Neve, hoje conhecido como Frozen, além de outros belos contos.
Sua vida pessoal foi solitária, marcada por amores não correspondidos.
Ele nunca se casou e há indícios de que viveu conflitos internos em relação à sua sexualidade.
Suas cartas e diários revelam paixões tanto por mulheres quanto por homens, embora nunca tenha tido um relacionamento confirmado.
Suas paixões, conflitos e perdas se refletem no modo como escreveu o conto A Pequena Sereia.
A história de A Pequena Sereia, tanto na versão da Disney quanto na de Hans Christian Andersen, é apenas um exemplo de como os autores inserem um pouco de suas experiências em suas obras.
Essas diferenças temáticas destacam como as narrativas de amor podem variar entre culturas e épocas.
A adaptação da Disney prioriza uma visão otimista, enquanto Andersen nos convida a considerar os aspectos mais sombrios da humanização.
Que tal, na próxima vez que ler um livro, uma poesia ou escutar uma música, tentar imaginar os sentimentos e as histórias que se escondem no ritmo e nas palavras?
O ser humano tem esse incrível poder de se expressar e de entender além das palavras.
Não sabes criança? ‘Stou louco de amores… Prendi meus afetos, formosa Pepita. Mas onde? No templo, no espaço, nas névoas?! Não rias, prendi-me Num laço de fita. Na selva sombria de tuas madeixas, Nos negros cabelos da moça bonita, Fingindo a serpente qu’enlaça a folhagem, Formoso enroscava-se O laço de fita. Meu ser, que voava nas luzes da festa, Qual pássaro bravo, que os ares agita, Eu vi de repente cativo, submisso Rolar prisioneiro Num laço de fita. E agora enleada na tênue cadeia Debalde minh’alma se embate, se irrita… O braço, que rompe cadeias de ferro, Não quebra teus elos, Ó laço de fita! Meu Deus! As falenas têm asas de opala, Os astros se libram na plaga infinita. Os anjos repousam nas penas brilhantes… Mas tu… tens por asas Um laço de fita. Há pouco voavas na célere valsa, Na valsa que anseia, que estua e palpita. Por que é que tremeste? Não eram meus lábios… Beijava-te apenas… Teu laço de fita. Mas ai! findo o baile, despindo os adornos N’alcova onde a vela ciosa… crepita, Talvez da cadeia libertes as tranças Mas eu… fico preso No laço de fita. Pois bem! Quando um dia na sombra do vale Abrirem-me a cova… formosa Pepita! Ao menos arranca meus louros da fronte, E dá-me por c’roa… Teu laço de fita.
Comentando o Poema
A quem foi dedicado?
Este belo poema certamente tinha de ser dedicado a alguém.
É contado em alguns lugares que o poema “O Laço de Fita” foi dedicado a uma formosa jovem paulistana chamada Maria Amália Lopes de Azevedo:
“Não sabes, criança? ‘stou louco de amores… Prendi meus afetos, formosa Pepita. Mas onde? No templo, no espaço, nas névoas? Não rias, prendi-me num laço de fita…”
A bela jovem mais tarde se tornaria dona das terras que hoje compõem o bairro do Tremembé, cuja principal avenida leva seu nome. Essa versão, porém, que faz dela a musa inspiradora de “O Laço de Fita”, não é confirmada pelos historiadores.
Simbolismos
Essa poesia de Castro Alves é um belíssimo exemplo do lirismo romântico, repleto de musicalidade, imagens vívidas e uma intensa entrega sentimental.
A repetição do símbolo do “laço de fita” confere unidade ao poema, transformando um simples adorno em um poderoso emblema da paixão e do aprisionamento amoroso.
O eu lírico se declara enfeitiçado por Pepita, e sua paixão não está presa a conceitos abstratos como templo ou névoas, mas sim a um elemento concreto e delicado: o laço de fita nos cabelos da amada.
O laço adquire um simbolismo duplo, representando tanto a suavidade do amor quanto a força de sua escravidão sentimental. A metáfora da serpente que se enrosca na folhagem reforça essa ideia de encantamento e domínio.
Esse jogo entre liberdade e cativeiro é um dos grandes temas do poema.
O eu lírico começa como um pássaro que voa livremente, mas é subitamente capturado.
Ele compara sua paixão a uma cadeia quase invisível, pois, embora sua força possa romper cadeias de ferro, ele é incapaz de se libertar do suave e frágil laço de fita. Essa contradição ressalta o poder avassalador do amor.
Romantismo
Na última estrofe, o tom se torna mais melancólico, evocando a morte como o destino final.
Mesmo após a morte, ele deseja que o laço esteja presente como sua coroa fúnebre, demonstrando a ideia romântica da paixão eterna, que transcende a vida.
Castro Alves, com sua habilidade descritiva, transforma um detalhe aparentemente simples — um laço nos cabelos — em um elemento que amplifica o fascínio de Pepita. O “laço de fita” não é apenas um símbolo de aprisionamento amoroso, mas também um adorno que intensifica a beleza da amada.
O verso “Na selva sombria de tuas madeixas, / Nos negros cabelos da moça bonita” destaca como o laço não apenas enfeita, mas dialoga com a imagem dos cabelos negros, criando um contraste e um jogo de luz e sombra que potencializam o magnetismo da personagem.
Esse detalhe sugere que a beleza de Pepita não está apenas em sua aparência, mas também no efeito que ela causa no olhar do apaixonado.
A eternidade
O laço, por ser um objeto delicado e passageiro, torna-se um símbolo da efemeridade dos momentos de encanto.
A forma como ele se movimenta na dança, como é beijado pelo vento (e não pelos lábios do eu lírico), reforça a ideia de que o desejo e a adoração se voltam para algo quase etéreo, um detalhe que, paradoxalmente, aprisiona e liberta ao mesmo tempo.
Os últimos versos:
“Pois bem! Quando um dia na sombra do vale Abrirem-me a cova… formosa Pepita! Ao menos arranca meus louros da fronte, E dá-me por c’roa… Teu laço de fita.”
O poeta dramatiza o amor como algo tão essencial que ele quer levá-lo consigo para a eternidade.
Não é apenas a lembrança de Pepita que ele deseja no túmulo, mas o próprio laço, símbolo de sua submissão apaixonada, de sua prisão voluntária nos encantos da amada.
Esse pedido final torna o poema mais intenso e sentimental porque sugere que o amor não termina com a vida, mas permanece como um desejo derradeiro, uma espécie de última vontade sagrada.
Essa visão reforça o tom romântico exacerbado de Castro Alves, onde o sentimento amoroso é vivido com tal plenitude que não há distinção entre amor e destino.
A força da poesia vem justamente desse exagero belo e arrebatador, onde um simples ornamento se transforma no emblema de um amor que transcende tempo e matéria.
Resumo biográfico
Castro Alves: O Poeta da Liberdade
O poeta Castro Alves foi uma grande expressão do Romantismo no Brasil.
Antônio Frederico de Castro Alves (1847-1871) foi um dos maiores poetas românticos do Brasil, destacado por seu engajamento social e político.
Nascido na Fazenda Cabaceiras, na Bahia, cresceu em um ambiente culto e, desde cedo, demonstrou talento para a poesia. Iniciou sua produção literária ainda adolescente e, aos 17 anos, já escrevia os versos de Os Escravos, tornando-se um ícone da luta abolicionista.
Publicou Espumas Flutuantes em vida, mas sua morte prematura, aos 24 anos, interrompeu uma carreira brilhante. Seu legado, no entanto, permanece vivo, inspirando gerações com sua poesia apaixonada e combativa.
Eugênia Câmara, grande amor do poeta
A vida intensa, somada às circunstâncias da época, contribuiu para seu declínio e, posteriormente, sua morte.
Castro Alves foi um homem de muitas paixões, apaixonando-se intensa e constantemente. Podemos citar Leonídia Fraga, que o amou desde o início sem ser correspondida, como merecia, ou mesmo sua primeira mulher, Idalina, e as irmãs hebreias.
Sua última paixão não correspondida foi a cantora italiana Agnese Trinci Murri.
Aquela que, porém, refletia seu espírito intenso e aventureiro foi a atriz Eugênia Câmara. Talvez por isso tenha sofrido tanto com as consequências da separação, marcada por brigas e traições.
Após uma vida intensa, faleceu em 1871.
A sua vida e importãncia serão abordados em futuros posts.
No centenário de sua morte, em 1971, decidiu-se pelo traslado de seus restos mortais para o monumento na Praça Castro Alves, em Salvador, sob determinação do então prefeito Antônio Carlos Magalhães.
A decisão contrariou um sobrinho-neto do poeta, que defendia a construção de um panteão. A transferência ocorreu sem cerimônia especial no dia 6 de julho daquele ano.
O que é fazer valer um sonho quando todos os sinais te apontam o mais fácil, que é desistir?
Às vezes, insistir num objetivo é saber insistir, apesar das frustrações. Por exemplo, como se sentem poetas, bons compositores e arranjadores quando percebem a qualidade da música atual e as mensagens nas letras (quando há alguma mensagem!)?
Não me acusem de reacionário, moralista ou seja lá o que for, com aquela frase batida de que tudo é questão de gosto.
É verdade que alguém sempre reclamará da decadência musical ao longo das décadas, mas isso também pode significar que os estilos coexistem e que prevalecem aquilo com que se identifica a sociedade atual. Por isso, ainda exerço o meu direito de gostar daquelas canções que chocam pela beleza, pela harmonia entre melodia e letra…
Como se molda o gosto musical?
A Música como Produto
O fato é que a maior exposição musical é dada àquelas canções com potencial de vendas, mesmo que seja por um curto período de tempo e que serão substituídas por canções bem parecidas, com o mesmo objetivo de vendas, em que a música é apenas um mero produto a ser usado e descartado. Ninguém sentirá falta quando o sucesso passar.
A música não tem sido encarada como arte a se eternizar; reduziu-se a um produto, um mero produto.
E Quanto às Obras-Primas?
Você talvez pense: “Ah! O Spotify, o Deezer, o YouTube e outros meios estão aí. A pessoa pode procurar o que quiser!” É verdade, mas você sabia que boa parte do que você gosta foi apresentado por alguém ou por um meio de comunicação?
Isso significa que, se as pessoas forem expostas a apenas um ou dois estilos de música, de melodias simples, terão dificuldades em se interessar por arranjos e letras mais complexas.
A exposição a vários estilos musicais seria essencial para ajudar na formação artística e cultural do indivíduo. Mas, atualmente, isso não acontece.
O “Jabá Turbinado” e o “Sucesso”
Hoje vivemos o “jabá turbinado”, que funciona de maneira sutil, mas extremamente eficaz.
Empresários, especialmente do campo do agro/sertanejo, não apenas pagam mais para terem seus produtos expostos, compram também estações de rádio, que tocarão exaustivamente seus produtos. A estratégia é composta por passos bem definidos:
Repetição Exaustiva: As músicas são tocadas repetidamente nas rádios compradas ou contratadas, garantindo que fiquem na cabeça do público.
Construção de Empatia: Comentários sobre a vida pessoal dos artistas, muitas vezes elaborados estrategicamente, geram identificação e conexão emocional com o público.
Narrativa de Superação: Biografias que destacam a saga do “herói humilde que alcançou o sucesso” são cuidadosamente construídas para comover e inspirar.
Marketing Integrado: Notícias, fofocas e até intervalos entre as canções são utilizados para manter vivo o interesse do público.
Outros estilos musicais não têm espaço nessas emissoras, porque o objetivo principal é vender o produto. Em especial, em pequenas cidades, presume-se que o público seja menos informado e, portanto, mais suscetível à manipulação.
A consequência? Pressões e negociatas surgem.
Cultura e Política
A população dessas cidades, ao saber que um astro visitou uma cidade vizinha, passa a pressionar o administrador público para trazer o espetáculo. E, muitas vezes, o administrador cede, gastando mais do que o orçamento mensal destinado à saúde ou educação para atender à demanda.
Shows patrocinados por verbas públicas frequentemente estão associados a mau uso de recursos, isso quando não há desvios. Alguns argumentam que “não usamos a Lei Rouanet”, mas é preciso esclarecer:
A Lei Rouanet foi criada para incentivar o financiamento da arte com recursos privados, permitindo deduções no imposto de renda dos patrocinadores, sem utilizar diretamente dinheiro público.
O “Sonho” de Comunicar
Um amigo meu, desde jovem, sonhava em ter uma estação de rádio para promover artistas locais e tocar canções de todas as épocas. Durante um tempo, ele investiu em um serviço de alto-falantes, o “Som da Cidade”, que trazia uma programação eclética com espaço para todos os estilos musicais, notícias locais e até transmissões das sessões da Câmara Municipal.
Com o sucesso do Som da Cidade, ele decidiu investir numa rádio. O início foi promissor, mas os problemas não demoraram a surgir.
O clima político da cidade era acirrado. Ao apontar falhas da administração pública, foi agredido fisicamente em duas ocasiões, em administrações diferentes. As paixões pessoais estavam acima dos interesses públicos e culturais.
O comércio local não se interessava em patrocinar a rádio, e os administradores públicos temiam associar-se a quem poderia denunciá-los. Além disso, o custo com direitos autorais (ECAD) era desanimador para quem desejava iniciar uma pequena emissora.
Documentos, contas e processos descansavam sobre a mesa do pequeno escritório que ele montou com recursos próprios, mas o sonho de erguer novamente a rádio nunca se concretizou. Ele gostava de ter seu nome ligado à comunicação.
Nos últimos dias, ainda sonhava em lançar um livro contando toda a sua batalha, desde as dificuldades em manter uma rádio com identidade própria aos seus desafios na construção desse sonho.
Seria um ótimo livro!
Reflexões
Desde jovem, sempre sonhei em escrever memórias, histórias, poemas, músicas… o que me viesse à cabeça. Hoje, sem o meu amigo, me pergunto: será que vale a pena insistir nesse sonho, quando o caminho mais sábio parece ser desistir?
Falar de música, poesias, histórias…arte! Sei que tudo mudará, certamente, mas em que direção?
Haverá algum dia espaço para se conversar sobre notícias, poesias, histórias e músicas longe das paixões doentias que apenas dividem e afastam? Haverá espaço para a diversidade ou apenas o poder financeiro fará da pessoas fantoches, ditando o que fazer e ouvir?
Um dia, retornando do trabalho, deparei-me com o que costumam chamar de pichações num grande muro que separa o bairro mais distante do caminho de onde moro. Ao olhar com atenção, percebi que o que pareciam ser borrões transformava-se na face de um escritor quando eu atingia certa distância, mas desaparecia poucos passos à frente.
Confesso que não sei se o efeito era intencional ou mero acidente, mas aquilo me fez refletir sobre o que é a arte. Esse é o dom da arte: fazer pensar, refletir!
Não sei quem foi o autor daquela imagem, nem se ele desistiu depois daquela arte.
Assim como ele, escrevo apenas por escrever. Não sei se alguém, na distância do tempo, vai parar, olhar ou mesmo se preocupar em entender o que tentei dizer.
Desejo apenas que alguém veja minhas palavras como vi aquela imagem no muro: da distância correta, ganhando sentido e, talvez, revivendo minhas histórias.
Quando penso na arte e na cultura em geral, frequentemente desejo desistir. É, realmente, caminhar sozinho, a um horizonte muito mais fácil.
Você já percebeu que passamos uma boa parte de nosso tempo imaginando, planejando, carregando sonhos que alimentamos por toda a vida? Isso é mais que natural…
Não se trata de fugir da realidade, a nossa mente gosta de viajar.
Às vezes, nos pegamos sozinhos e, de repente, percebemos que a nossa mente nos levou a tempos e lugares incríveis. Visitamos pessoas que estão escondidas nos cantinhos mais ocultos da memória e, às vezes, refazemos velhas experiências.
A difícil tarefa de lidar com um mundo onde tudo se tornou descartável, desde pessoas até a arte, é desgastante. Por isso, as mentes inquietas buscam refúgio em outros horizontes…
Não se preocupe, você não está louco e nem está enlouquecendo… Permita-se sonhar um pouco!
“Ah! Mas enquanto eu ficar sonhando, o tempo passa. E tempo é dinheiro!”, você talvez pense.
Ninguém te disse para passar o dia inteiro sonhando… Disse? (Risos)
Novos planos
Então, vamos lá… Permita-se realizar alguns sonhos, tais como aprender a tocar algum instrumento, cantar, escrever poesias, ler um pouco mais, ou aproveitar a sua família.
Está bem… Mas, se nada disso soar um pouco atraente aos seus ouvidos, pergunte-se: “O que realmente me atrai?”
Se sua resposta não incluir a alegria de quem te ama ou de quem você ama, talvez seja a hora de repensar. E, se nada disso for importante para você, o mundo não vai mudar — vai continuar exatamente o mesmo.
Pois as pessoas não costumam pensar na sociedade como um todo; pensam apenas em si mesmas (a família é pretexto!).
Se a sua resposta for diferente, você não é um mero sonhador. É um legítimo ser humano!
Então, permita-se sonhar, pois é a imaginação que nos ajuda a criar coisas novas e encontrar uma saída. Ainda é tempo:
Motoristas experientes costumam agir automaticamente diante de mudanças de sinal ou sinais de perigo nas rodovias.
Reduzir a velocidade ou mudar a direção pode ser tudo o que separa a segurança do risco.
Às vezes, tomar um caminho diferente é exatamente o que se precisa para chegar ao destino.
Você talvez se pergunte: mudar de direção pode atrasar a chegada ao destino. Compensaria tal sacrifício?
Isso depende das suas prioridades.
As prioridades e o verdadeiro sucesso
Não é incomum ver pessoas sacrificando família, amizades e até mesmo a própria moral para alcançar um objetivo mais rápido.
Mas, o que é o sucesso se, para alcançá-lo, abrimos mão das coisas que dão sentido à vida?
É verdade que algumas pessoas não se importam com quem deixaram para trás. Talvez nunca tenham tido apego a amizades ou sentimentos. Não as criticamos.
Por outro lado, se você não pensa assim, fique tranquilo: você é normal.
Sucesso não se mede pelo acúmulo de riquezas ou pela fama. O verdadeiro sucesso está na satisfação de fazer o que se gosta.
Carregar um título ou alcançar um status não significa necessariamente ser bem-sucedido.
Às vezes, abrir mão de certos planos e mudar de direção é necessário para não deixar para trás aquelas pessoas que queremos ao nosso lado por toda a vida.
Por elas, estamos dispostos a ajustar a rota — afinal, o que pode ser mais valioso do que compartilhar o sucesso com quem amamos?
Esteja atento: no futuro, o resumo da viagem será o mais importante. E as viagens são sempre melhores quando não estamos sozinhos.