Gilson Cruz
Parecia que naquele dia tudo ia ser diferente…
O Galo acostumado a anunciar nas madrugadas o nascimento do dia, sabia de suas responsabilidades e por isso pensava:
-“Como é que o Sol vai aparecer sem o meu canto?”
E preparou-se, fazendo o aquecimento costumeiro e… “Coo-cco-ri-cóóóóóóó”…
Foi um cocoricó digno de uma ópera…
Mas, a luz não veio…
Tudo continuava escuro como a noite, as estrelas faziam a festa no infinito, mas o galo insistia…cantava, gritava… suava.
Enquanto isso, os vaga-lumes se divertiam, faziam a festa entre as ruas, jardins… Pareciam reflexos na terra das primas estrelas lá no espaço distante.
A raposa vermelha saiu para um passeio e para um bate papo com a Dona Coruja que já sabia de cor o nome de todas as constelações!
Os Morcegos voavam animados pelos céus e ousados faziam acrobacias incríveis…estavam loucos de alegria.
Até a tímida da Dona Jiboia Constritora resolveu esticar os músculos por umas horas.
Todos agora podiam aproveitar um pouco da escuridão.
Os vigilantes aproveitaram e cochilaram um pouco em serviço – por favor, não conte aos patrões!
Agora o Aye-aye estava de malinhas prontas, preparado para aquela viagem programada há milhares de anos, e a Pantera Nebulosa reunia a família para contar estórias de escuridão.
Desesperado, o galo convidava aos outros galos para acordar o Sol, o dia precisava nascer.
Foi quando o Lêmure de cauda anelada decidiu passear, num desfile sem igual.
Aquela noite parecia não acabar.
Naquele dia as pessoas esqueceram de programar seus despertadores, dormiam em paz.. e enquanto as pessoas dormiam, a vida acontecia.
E quando os galos, esgotados, desistiram de cantar, o Sol que naquele dia estava escondido, encantado, apaixonado pelas criaturinhas da lua, tristemente, teve de cumprir o seu papel, trazendo luz e acordando as pessoas com suas pressas, seus desesperos e desânimos.
As mesmas pessoas que passam pelas ruas e pela vida sem rir ou se encantar com os risos das crianças, sem se alegrar com a alegria dos pequenos cachorros ou mesmo sem se apaixonar no beijo da pessoa amada, as que passam a vida sem dizer “eu te amo” a um amigo e sem agradecer a Deus todas as pequenas coisas que preenchem a vida .
E viu que a vida seguia, de pernas pro ar… num ciclo finito de nascer, crescer e morrer.
E por muitos, muitos dias, o Sol sentiu saudades da noite.
Palavras de 2023 – o ano que passou! ‣ Jeito de ver
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