RECORDAÇÕES ( Um momento de reflexão)

Um pai e um filho caminham nos trilhos. Recordações por Gilmar Chaves.

Recordar… é viver ou sofrer na saudade.

Imagem de Nato Pereira por Pixabay

Estação ferroviária de Queimadas, Bahia.

GChaves

Recordar… é viver ou sofrer na saudade.
Às vezes nos encontramos em pensamentos perdidos, também conhecidos como lembranças. Pensamentos esses que nos levam a lugares distantes, tão distantes que nos remetem ao passado.
E desse passado, memórias de momentos bons e ruins da vida (ruins porque certas lembranças doem, certas saudades doem, doem muito!). Pelo menos é sempre assim comigo. Ainda mais quando se trata de momentos vividos, da infância. Até pequenas mensagens tocam fortemente no peito, e a sensação de aperto me traz quase sempre lágrimas nos olhos.
Parte de uma mensagem poética, da qual não conhecia o autor, mas conhecia a pessoa que com carinho me enviou por saber da minha sensibilidade a bons textos, diz assim:
“Como era belo esse tempo
De tão doces ilusões,
De tardes belas, amenas,
De noites sempre serenas,
De estrelas vivas e puras;
Quadra de riso e de flores
Em que eu sonhava venturas,
Em que eu cuidava de amores”. (Casemiro de Abreu)

Quando deparei com a linda mensagem, minha mente retrocedeu, obrigou-me a percorrer por lugares vividos, e no espaço entre o meu peito, uma fenda se abriu, sugando a minha resistência de adulto e me aprisionou, fazendo com que sentisse como uma criança insegura, que carece do afago de mãe, aquela atenção que só o amor materno prestaria.
Dentre os caminhos em recordações percorridos, estive na primeira cidade do interior. Anteriormente a minha família residia na capital e por circunstâncias que desconhecia, nos mudamos.
Imagine, na mente e visão infantil a transferência de um lugar agitado para um lugar, onde a viagem de mudança foi feita dentro de um trem de passageiros “que hoje raramente existe”, observando o movimento e o som da estrada de ferro, bem como as admiráveis paisagens naturais, os lugares passados, as novas denominações à cada parada, pois as paradas eram nas cidades onde tinham estações. Alguns lugares até mesmo neblinavam e tornava impossível observar além de alguns poucos metros. Ahhh!!!!…como era gostoso e ao mesmo tempo assustador! Expectativas causam euforia e medo!
Enfim, chegando ao novo destino ‘cidade do interior’, tudo era novo. Novas visões, de um novo lugar: estação, balaustrada, depósito de máquinas e vagões, caixa d’água com a sigla da rede ferroviária “LB-Leste Brasileira”, até o ar, percebia-se, era diferente, mais suave, era saudável. Andorinhas e cardeais sobrevoavam, compartilhando com harmonia do mesmo espaço ao céu.
Adiantando alguns dias na nova morada, uma casa enorme, cheia de quartos, até mesmo no quintal ‘que era imenso! ’, e também muitas árvores frutíferas.
E o rio?! Conheci até mesmo um rio, pois então só tinha noção realística do mar, água salgada. Não mudei da água para o vinho ‘literalmente’, mas mudei da água salgada para a água doce, as águas do Rio Itapicuru. E lá, às margens do rio, encontrava-se um lugar muito bem frequentado a INGAZEIRA, área onde a população frequentava por ter árvores frondosas, que eram muito bem aproveitadas como trampolim.
Realmente, como era belo esse tempo, de tão doces ilusões, de tardes belas, amenas…
Ahhh!!!! Queimadas! De Salvador-Bahia, lugar agitado, onde não se confiava segurança aos filhos na rua, para Queimadas-Bahia, lugar onde o contato com a natureza lhe permitia até mesmo tirar leite de vacas (no meio da rua). Mas, isso fará parte de uma próxima recordação.

Gilmar Chaves 23/05/2023

Leia mais  O tempo ( Contador de histórias) – Jeito de ver

E LÁ ESTAVA ELE! ( um dia incomum)

Um Velho Senhor parado no tempo.

E lá estava ele.

GChaves

Sempre a passeio pelas ruas da cidade, contemplando momentos de descontração, reduzindo obrigatoriamente no trajeto urbano (devido aos quebra-molas), os pensamentos fluíam numa concentração necessária, pois assim, quem sabe o estresse e ansiedade diminuíssem, proporcionando àquela mente um pouco de alívio.

Porém, num certo dia, passando pelas mesmas ruas, uma cena, aparentemente vista antes, repetia-se.

No passeio de uma humilde residência “lá estava ele! ”

Um senhor que chamara a sua atenção, pois, aquela matéria, ali sentada, com o olhar fixo ao vazio do tempo, com suas pernas cruzadas, vestindo jeans, camisa de mangas compridas, sandálias havaianas pretas e um relógio (talvez oriente), o caracterizavam.

Era perceptível naquela humilde residência aquele humilde cidadão.O que despertara a atenção era o fato de aquele corpo imóvel, estar fixando o olhar no vácuo do tempo, mas, com certeza a sua mente o estava direcionando para algum lugar.
O semblante mostrava naquele senhor o cansaço que o passado lhe causara. A pele enrugada e um ar de nenhuma perspectiva para o futuro, aqueles momentos já lhe pareciam necessários para o vazio e o tempo sem pressa passar.

Curiosidade ainda maior, quando, em outro dia de passeio e contemplação pelas ruas da Cidade, num dia chuvoso, nublado e os chuviscos batendo e escorrendo pelo para-brisa, naquela rua, naquele passeio, notoriamente, LÁ ESTAVA ELE, nas mesmas condições serenas, clima de paz interior ou preocupações “só ele poderia revelar”.

Mas, para aliviar as preocupações de um observador ansioso e estressado, melhor pensar e crer na paz interior, só que dessa vez, ao seu lado, compartilhando das mesmas gotas de chuva e deitado enquanto ele olha para o tempo, um cão vira-lata, branco com machas pretas, ou preto com manchas brancas, isso até nem importa tanto, mas o que valeu mesmo naquele momento, foi saber que, com aquele senhor envolvido nas suas realidades internas e numa ótica externa de uma realidade imaginária, havia com ele um verdadeiro amigo.

Com certeza, ao passar novamente por lá, ele ou eles estarão repetindo a mesma cena curiosa.

E, quem sabe, o ansioso e estressado se aproximará para saber um pouco daquela mente que tanto despertou a curiosidade.

Gilmar Chaves 21/05/2023

Gilmar Chaves, Professor, Poeta, Conselheiro e membro da formação inicial da Banda Experiência. A arte de observar e fazer parte da história.

Veja  mais em:  O tempo ( Contador de histórias) – Jeito de ver.

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