Notícias de paz para a Zona Sul

Helicóptero Apache.

Helicóptero em operação

 

Os helicópteros passavam acima das casas e Gualber abraçava suas três filhas na sala, o único local protegido por uma laje, próximo à parede aparentemente blindada. A ideia de blindar um dos vãos veio de Marisa, pois os traficantes às vezes trocavam tiros com policiais nas proximidades. As filhas pequeninas, já não eram mais inocentes; as idas para a escola eram exercícios de amadurecimento.

Mas agora seria diferente.

Parecia que desta vez o governo cuidaria do povo dos morros. Haveria uma hora em que poderiam sair e, quem sabe, usufruir um pouco de paz na pracinha mais acima. A música o acompanhava em seus exercícios diários e nas aulas que mais pareciam jam sessions, de tão agradáveis que eram.

Bom músico, Gualber desistira do sucesso, pois para ele, não havia algo que fizesse sentido na atual música pasteurizada. Os seus sonhos de sucesso no entretenimento foram transferidos para as aulas de música que dava.

O combate se intensificava à noite e, na manhã seguinte, o governo se gabava de sua bravura por enfrentar o crime organizado em longas entrevistas.

Até que um dia… Enfim, os jornais noticiavam a fuga dos bandidos. A notícia era transmitida como espetáculos para gringos se sentirem motivados a turbinar o turismo local. Enfim, a televisão noticiava a paz.

E depois de muitos meses, amedrontado, Gualber poderia então sair sem medo, com seu instrumento, para mais um dia de aula.

Abraçou Marisa, beijando ternamente a sua testa. Observou o transporte escolar que levava cada uma de suas três filhas, que acenavam alegremente nas poltronas intermediárias.

Olhou para a ladeira e o muro branco que vinham antes da rodovia, que teria que passar até o ponto de táxi a 300 metros à esquerda.

Gualber visualizou o muro, sentiu a paz e, em vez de um case, levou a guitarra num estojo simples, preto. Chegando ao muro, sentiu a paz e, olhando para os dois lados, colocou o suporte da guitarra nas costas, sobre os ombros.

E de longe, aqueles que trariam a paz não viam um professor portando um instrumento; viam um negro e, em seus subconscientes, negros eram perigosos – e aquilo seria certamente uma arma.

E agindo como os mesmos marginais que combatiam, atingiram o alvo.

E lá no meio da pista, Gualber se perguntou por segundos: “Por quê?”

Mas jamais irá entender o que já sabia…

E a paz noticiada habitava a mente de Gualber, enquanto os helicópteros levavam notícias para a zona sul.

 

Leia também: Um bom rapaz – uma crônica. ‣ Jeito de ver

A verdade por trás da operação que matou o músico Evaldo Rosa (apublica.org)

 

A vida e obra de Mary Star

Marilene Santos, como tantas outras crianças, nasceu num lar pobre, carente de amor. Seus pais trabalhavam o dia inteiro, dedicando pouco tempo a ela.

Nas manhãs, Marilene costumava ouvir no rádio as canções que sonhava um dia cantar. Rádios não têm rostos, apenas vozes – muitas vozes. E Marilene tinha uma linda voz.

Sua voz doce combinava naturalmente com quase todo estilo musical, e nos karaokês da vida, a cidade descobria um novo talento – batizaram-na de Mary Star, pois ela certamente seria uma estrela que brilharia acima dos holofotes!

Mary evoluiu, estudou música e inspirada em sua própria vida, compôs canções de superação, amores não correspondidos e esperança. Mary certamente estava destinada a ser uma estrela!

Na pequena cidade onde morava, havia poucos cantores. Breno se destacava por fazer mais apresentações. Se você quer saber, ele não tinha uma voz agradável, mas tinha um ótimo empresário que sabia colocar o seu produto em todos os eventos, e assim ganhou fama.

Talvez o fato de seu empresário ser filho do administrador público tenha ajudado um pouco em sua carreira. Mas, se for para subir na vida, toda ajuda é bem-vinda!

Mary, porém, acreditava que um dia seria descoberta por seu talento. Quem sabe um dia, um empresário também se encantaria com a sua voz, e ela poderia então viver daquilo que amava…

Com o seu violão, no meio da praça, microfone ligado, enquanto alguns passavam e depositavam moedas de pequeno valor no case depositado à frente do palco improvisado, Mary soltava a voz em busca de mais um sonho!

E um dia, o sonho esteve prestes a acontecer!

Num desses belos domingos, alguém ouviu a sua voz e também se encantou!

Mary transbordava de alegria, sua voz estaria nos rádios, ela brilharia nos programas de televisão.

E o teste para a gravadora Beauty Records foi agendado para a semana seguinte.

Ela escolheu suas melhores composições, seus melhores amigos e músicos e, antes da hora marcada, se apresentou na Beauty Records!

Muito bem ensaiado, as gravações foram feitas em apenas um Take. Músicos, cantores e produtores entusiasmados!

Por fim, Mary foi chamada para assinar o tão desejado contrato.

Ansiosa, ela leu apressadamente as primeiras linhas e seus olhos marejaram.

À medida que a leitura avançava, entrou na sala Deisy, uma linda jovem, também aspirante à carreira no universo musical. Mary não percebeu.

E entre as muitas frases enroladas nas nove páginas, uma calou fundo na alma de Mary.

“A artista Marilene Santos, conhecida como Mary Star, aceita de livre e espontânea vontade ceder as gravações e o uso de sua voz a favor da Beauty Records, que se encarregará de impulsionar a sua arte por meio de Deise, que se chamará Deisy Star. Receberá um salário mensal estipulado por esta gravadora, por cinco anos ou pelo tempo que durar o contrato”.

Sem entender a cláusula, perguntou a Fred Brandão, dono da Beauty Records:

-“Por que eu mesma não posso interpretar as minhas canções?”

A resposta do diretor soou fria, mas era a mais absoluta verdade no mundo da música:

-“Marilene, você canta bem e tem boas músicas! Mas isso é menos do que necessário para fazer sucesso! Você precisa ter uma aparência sexy, pois isso vende. A Beauty Records já tem a sua cota de diversidades preenchidas por aquilo que a sociedade e os meios de comunicação cobram. Não há necessidade de mais.”

Doeu ouvir aquelas palavras.

-“O único modo de você viver de sua arte é aceitando essa proposta! É pegar ou largar!”

Atordoada, sem entender nem mesmo o que sentia, Marilene recolheu as partituras, desejando rasgá-las. Seus olhos lacrimejavam enquanto ela e os músicos se dirigiam à saída do escritório.

Ao chegar em casa, ligou a televisão, enquanto o apresentador (logicamente pago) anunciava a mais bela voz do país: Breno Silva, agora com a alcunha: Breno Silva, o Romântico!

Enquanto a voz fraca e desafinada ecoava pela sala… Marilene sentou-se nos degraus em frente à sua casa e entendeu o porquê de tantos cantores ruins aparecerem tanto na mídia.

Talvez você me pergunte: “Onde posso encontrar a Mary Star? Talvez ainda haja uma chance…”

Ela pode ser encontrada nas belas vozes que lutam por um lugar ao sol, sem o apoio de empresários, de políticos e de pessoas que idolatram cantores ruins… por serem belos!

Mary ainda canta nas praças…

Leia também: A música atual está tão pior assim? ‣ Jeito de ver

De Degraus e Silêncios – Um Pai Solitário

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Imagem de Paul Sprengers por Pixabay

Sentado sozinho, nos degraus em frente a sua casa, ele passava os dias.
Há pouco tempo, seu filho deitado num velho sofá, na sala, dormindo, confiando no poder amoroso da cura, na presença dos pais.
Ainda sonhava com os tempos em que um beijo no machucado aliviava as dores e fechava as feridas, embora isso já fosse há mais de quarenta anos no passado.
Mas, filhos não envelhecem…
E sentado sozinho nos degraus, o pai não olha para trás, para não lembrar do amor de sua mocidade, já cansada de carregar o peso do tempo, indo e vindo entre a cozinha e a sala onde o eterno menino dormia.
Relembra as primeiras quedas, os abraços e os planos para o futuro…
E acredita no ciclo natural…em que os mais velhos preparam o mundo para os novos.
Mas, desta vez não foi assim…
E ele sentado nos degraus, sem olhar para trás, tenta questionar o tempo. Como se estivesse ansiosamente esperando uma resposta do futuro.
Pois desta vez, a sala vazia e o silêncio na cozinha, lembram quantas adversidades um homem só – neste mundo tão grande – pode enfrentar, sem entender o motivo.
E ele jamais entenderá…

Gilson Cruz

Veja também Noites de outono (Poema Simples) ‣ Jeito de ver

Solidão: o que é, causas, sintomas e tratamento (indicedesaude.com)

Canções do Silêncio e das Estrelas

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Imagem de 2341007 por Pixabay

O que mais tortura um escritor se não a falta do que escrever?
Bem, quando se refere a este trabalho até a falta de inspiração é objeto de escrita.

Me fogem ideias, me faltam palavras..

Poderia falar sobre aquele jovem senhor que cuidava de sete cachorrinhos e que diariamente repetia a Deus que ficaria rico. Que seria um dia cantor de músicas internacionais e ficaria famoso e ganharia também numa dessas loterias da vida.

As estações pareciam longas e intensas…

O fato é que todos os dias, antes mesmo de o sol sorrir, ele, acompanhado de seus amiguinhos, revirava os recicláveis para lotar o seu carrinho e extrair das sobras dos restaurantes o alimento dos pequenos companheiros.

Alguns poucos anos se passaram e num desses invernos os cachorrinhos vagavam pelas ruas, procurando amizade e consequentemente um pouco de alimento…

Cães também comem, é verdade!

O amigo dos cães desaparecera! – Ele abandonara os seus amiguinhos.

Segundo alguns diziam: “A vida lhe sorriu”.

Diziam alguns, que aquele homem, sem nome, estava agora bem de vida.

“Que Deus lhe ouvira as preces…”

Que bom!  Mas, não diz isso aos cachorrinhos… estavam sozinhos agora!

Agora que as noites de inverno passavam, os bares da cidade passaram a contar com música ao vivo.

A praça lotada, pessoas felizes aplaudiam a linda voz do cantor que sonhava em um dia, poder mostrar seu talento a públicos maiores.

E depois de horas, a apresentação chegava ao fim.

Namorados passeavam a contemplar um último brilho da lua e quem sabe levar um último beijo de boa noite.

E enquanto todos se deslocavam para suas casas, satisfeitos, não percebiam os mesmos cães deitados ao redor do que seria um novo amigo.

As noites de inverno não são românticas, nem mesmo nos nordestes do Mundo.

Por isso, as pobres criaturas envolviam agora o seu Novo dono, alguém de olhar triste e pele sofrida, que para fugir da vida ou das memórias, adormecia no meio da praça e despertava como o auxílio daquilo  que o inebriava.

Há alguém que não leve consigo um passado? Alguns o temiam, acreditavam ser um fugitivo –mas, todos são fugitivos de algum modo!

Não falava muito sobre família, amigos – nada.

Apenas dizia ao Carteiro que esperava um cartão, que viria de um antigo lugar, chamado Mimoso. Sem falar muito mais a respeito.

Diziam nas ruas que conversar com bêbados ou cuidar deles é trabalho para heróis e que nem mesmo ambulâncias seriam deslocadas quando se tratasse de acidentes com eles.

Línguas maldosas!

Mas, o fato é um dia o encontrei dormindo, cansado de esperar o movimento lento das coisas e enquanto ele dormia, coloquei em suas mãos um desses lanches que não sustentam um dia inteiro, mas que era bem melhor que o álcool.

É estranho perceber que hoje, não consigo lembrar o nome dele.

Mas, num dia desses cansado de viver esperando, por ninguém sabe exatamente o quê, seu coração decidiu parar…

Aqueles que criticavam o seu modo de vida…estavam atônitos…de certo modo, tristes.

Me faltam palavras para descrever o que senti. Sei que a vida lhe foi breve.

Quando percebo como alguns sobrevivem com tão pouco, sinto a vergonha alheia de ver como alguns estão dispostos a prejudicar centenas de outras pessoas em fraudes para fins e atitudes egoístas.

Não ouvi anúncios de sepultamento. Alguém talvez chore a sua falta e lamente a sua vida ausente.

O universo porém, continuará frio e inóspito. Não se apagarão estrelas por ele…

O verão chegaria há apenas quatro dias…e novamente os pets andariam sozinhos… nas mesmas praças.

Enxotados e maltratados, como pessoas ignoradas.

Me tortura a alma, não saber o que dizer.

Gilson Cruz

Veja também Retratos da vida – o que deixamos passar ‣ Jeito de ver

Those were the days… My Friend!

Dedicated to the best Teacheres  Ever…

Those were the days…
Have you ever heard an old song that brings you back wonderful memories? Oh! Yes, it sometimes happens to everyone.
But today, I would like to tell you about one little experience I had…
Some years ago (about 14 years ago) I was kind of depressed, tired of years of hard working and so sad about a great loss in my family.
So I decided to study English.
Well, Itaberaba City wasn’t too near my house, but I decided to learn something new.
And what I found there? I started studying English at CCAA. I confess, I was a little ashamed because of the young class I found there.
The only guy older than 16 was I (I was only 38…lol) And as an old saying here, in Brazil “Old parrots don’t learn talkings”, something like that.
But then a Young and wonderful teacher came into the class. He had the brightest smile I’ve ever seen and he was always kidding about things, life and stories.
And then he took us to know all the CCAA Crew. Meire, Cátia, Cláudia and Libério, the great. That team was like a family to me. I found a reason to keep on studying.
Patient, wise and with a lot of stories about travels around the world he used to make the students dream about the possibilities of knowledge.
A great methodology, but kind above the greatest wish of helping us to learn.
The First semester flew like a wind and so did the other semester… A wonderful crew I found there. And as all in life the time I had to go has come.
I confess, I was sad (and the teacher was relieved! Lol)
As I remember teacher Parísio as the greatest teacher and Friend ever (he’s really an amazing person!), Libério, as great as Parísio, a wonderful and inspiring storyteller, Jamille a friend, why shouldn’t I say she was an angel? And about Meire, the sweetest and the most lovely person I knew.
And now…the old parrot is speaking! Lol
Perhaps 13 years is a long time and I may have forgotten loads of things.
But how can I forget those days?
Oh, My! Those were the days…as the music said!”

 

Read more:  “How It Would Be… – Poem of a New Day” ‣ Jeito de ver

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CCAA em Itaberaba, Bahia.

 

 

Banda Acordes – a Banda que não aconteceu

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Imagem de Cristhian Adame por Pixabay

 

Quando alguns sonhos não se realizam, nascem histórias que alimentam novos sonhos”

– Gilson Chaves

 

Permita-me contar um pouco da História da Banda Acordes – A Banda que não aconteceu.
O mês de Dezembro de 1987, foi marcado por uma tragédia familiar, a perda do Tio Salomão, aos 36 anos de idade, vítima de um AVC.
Naquele verão, fui ao rio Paraguaçu para espairecer, aquele era o melhor lugar do mundo pra isso. No verão, as pessoas fugiam dos fornos de suas casas e mergulhavam naquelas águas escuras.
Havia um lugar conhecido como “a Prainha”, era um espaço de aproximadamente 50 metros, situado à margem esquerda, onde aos domingos as famílias iam para pequenas partidas de futebol de areia, para a prática da capoeira ou para piqueniques, quando as duas primeiras opções permitiam.
Duzentos metros à esquerda deste lugar, as mulheres tratavam “o fato” dos bois ao amanhecer, deixando no ar da região um “perfume” característico. Provavelmente nenhum outro lugar no mundo tinha aquela fragrância, levemente desagradável…
Não à toa, os cachorrinhos da região olhavam e cheiravam, com uma certa admiração e desejo, os banhistas daquele lugar!
Naquele lugar, se deu o primeiro contato com o Valdomir.
A gente tinha a mesma idade e  ele tinha um conhecimento básico de violão.

A memória me trai, mas de algum modo ele sabia que uma das lembranças que eu guardava do meu tio era uma “dedeira” – um adaptador que ajudava a extrair um som mais acentuado dos bordões do violão.

Me perguntou naquele dia se poderia levar o violão e testar a dedeira. Consenti.

E naquele dia ouvi pela primeira vez um dedilhado perfeito de The House of the Rising Sun.
Não conhecia nenhum acorde no violão e o novo amigo, com o tempo, me ensinou a tocar “Meu Pequeno Cachoeiro”, em três acordes. A amizade se desenvolvia e consequentemente os planos de montar uma banda também também cresciam.

Ele tinha um violão Tonante, boca de osso, como era conhecido – cujo timbre se assemelhava ao das guitarras sessentistas.
Ganhei de meu Pai, com uma certa dificuldade, um velho Di Giorgio, segunda mão, que tinha uma aparência sofrida, castigada pelo uso dos velhos seresteiros, mas uma sonoridade maravilhosa. O vendedor conseguiu vender caro o violão moribundo, mas não enriqueceu com a façanha.

Paralelamente, Pedrinho, o irmão de Valdomir, se tornava um dos melhores baixistas da época, tocando em bandas como a Eclyps ( sim, essa era a grafia,  e que ninguém se ouse a dizer que está errada!) e na Fluid’ Energy (sei lá o que é isso! Mas, esse era o nome, ou algo parecido) que era praticamente a mesma banda Eclyps, com um nome diferente.

Pedro era guitarrista e baixista virtuoso.
Não cantava bem, mas tocava MUITO, muito bem.

Para a bateria, o amigo Dilson Borges.
Dilson era o mais experiente de todos. Já havia trabalhado em bandas como a Doce Magia e, se não me falha a memória, na Legenda.
Apesar de intuitivo, improvisava tranquilamente do Rock ao Jazz. A marcação e as viradas perfeitas eram a sua marca.

Era então início da década de 1990 e a base estava formada. Mas, havia um porém… nenhum dos membros tinha dinheiro para comprar instrumentos, nem sequer usados! A aquisição de instrumentos musicais não era tão fácil como é hoje.
Costumávamos treinar usando velhas caixas de repique e pratos para percussão ( emprestados de escolas) e os violões Tonante e Di Giorgio, na marcação de baixo e guitarra.O repertório era vasto. Trazia desde clássicos dos anos 60 até o Pop do início dos anos 80 e 90.

A inocência às vezes beira a burrice, como diziam os antigos da cidade.
Depois de muitos ensaios decidimos produzir uma fita demo. E a peregrinação atrás de quem pudesse emprestar alguns instrumentos começou.
Convenhamos, os músicos da época, que batalharam por seus instrumentos, ou que receberam de seus pais que podiam lhes bancar,  tinham um ciúme especial e natural por estes, não era muito agradável emprestá-los a possíveis concorrentes. Por isso a negativa costumava vir de modo disfarçado, no ditado quase popular: “Quem quiser também fazer um som, deveria também trabalhar para conseguir os seus próprios instrumentos”.

A Banda Acordes conseguiu um dia numa sede de uma bandinha, ainda início de carreira, a permissão para usar os instrumentos e a aparelhagem para gravar uma demo. Dilson não estava presente e foi o melhor que poderia acontecer, pois durante os ensaios o dono dos equipamentos desregulava intencionalmente, causando sons extremamente desagradáveis.

O desapontamento só foi maior quando ele se dirigiu em particular ao Pedrinho nas seguintes palavras: -“Eu NÃO gosto de emprestar meus equipamentos. Quem quiser gravar ou fazer algo bom, que lute pra comprar os seus…” (Olha o dito quase popular!)

– Um NÃO mais objetivo doeria bem menos!

A peregrinação voltaria acontecer, desistir não era a opção. A demo deveria sair.

E assim se deu.

Sem instrumentos e sem lugar para tentar gravar uma fita apresentação. As coisas estavam realmente difíceis.

Três anos de lutas e quase sem esperança, nos dirigimos ao Senhor Adalberto de Freitas, o Bugaiau, o principal comunicador e incentivador da cultura da cidade, pedindo uma oportunidade de gravar umas canções em seu estúdio. Contrariando as expectativas, o senhor Adalberto riu e concordou. Ficamos em êxtase!
Até esquecemos que não tínhamos os instrumentos!

A gravação no Studio Som da Cidade, do Bugaiau, começaria às 13 horas.
E então a romaria atrás de pessoas que talvez  cedessem os benditos instrumentos, começou.
Zé da Leste, cedeu um pequeno teclado de 3/8, os meninos dos Bárbaros do morro emprestaram uma guitarra, a bateria não me lembro de quem Dilson conseguiu, mas era boa, e então consertamos um velho e lindo contrabaixo vermelho, de sonoridade horrível, mas que funcionou, para a sessão. 

O repertório trazia The Beatles, Procol Harum, Jovem Guarda e algumas canções românticas.
A sessão foi marcada pelo entusiasmo, pelos vocais de Juarez e com exceção do Dilson, nós três revezávamos nos demais instrumentos, de acordo com a música. O dia foi longo, cansativo e posso dizer, um dos melhores dias da minha vida – até então.

Ao sair dos estúdios do Som da Cidade, a realidade caiu como uma tempestade no inverno, gelada e triste.

O amigo que cedeu a bateria explicou ao Dilson, que não mais a emprestaria, e talvez estivesse correto, era difícil também para ele!
Os meninos dos Bárbaros continuaram dispostos a ajudar, essa sempre foi uma característica deles.
O dono do contrabaixo, ao saber do conserto, pediu de volta imediatamente…

Infelizmente, a vida testava a paciência da banda.
Com o tempo o Valdomir encontrou a mulher que se tornaria a mulher de sua vida, o Pedro voou para São Paulo, Dilson desistiu da Banda e quanto a mim, fui trabalhar nos Correios, lá em Santa Terezinha.
15 anos depois resolvi voltar e investir nos instrumentos e tocar um pequeno projeto com o meu baterista favorito: o Dilson.
Ele costumava rir e dizer: – “Mané, você não desiste nunca”
E a resposta: “Pois é, Mané…Como é que se desiste? A gente não pode desistir..”

Numa desses diálogos repetitivos, dos manés, a gente tocava Reflections of my life, do grupo The Marmalade.
E as horas se apressaram, os dias correram desesperados, para que em poucas semanas, um acidente vascular cerebral respondesse a pergunta: “Como é que se desiste?”
E o sonho de fazer a banda, acabava ali. Na morte do irmão e melhor amigo.

Apesar de não ter sido, a Acordes foi uma boa Banda. Os ensaios eram engraçados e as canções soam maravilhosamente bem em minhas memórias afetivas.

Depois de 33 anos, de fato, um longo tempo, voltei a ouvir a algumas daquelas fitas. Não chorei, apesar da vontade. Algumas lembranças me fizeram esquecer as dificuldades e extrair um pouco daquela alegria, do tempo em que o sonho era apenas fazer música.

Ao ouvir hoje as velhas gravações, um misto de emoções invadem a minha mente. Vocais desencontrados, guitarras desreguladas, contrabaixos às vezes exagerado, as brincadeiras do Valdomir fazendo palhaçadas, conseguindo rir da falta de condições, o olhar desiluidido do Pedrinho imaginando o fim do projeto e o Dilson  fazendo milagres numa caixa improvisada…

É verdade que hoje, a saudade é o melhor palco que existe, os subtons se transformam em estilos – e o pequeno público, na maior multidão.
A banda Acordes ainda vive quando lembro de quatro amigos, que mesmo contra os ventos e tempestades, estavam juntos planejando fazer algo diferente.  O que de algum modo, fizeram.

 

Veja também É hora de ouvir o “MADDS” – se permita ‣ Jeito de ver

 

Infelizmente, a vida testava a paciência da banda…

Até esquecemos que não tínhamos os instrumentos!

Ele costumava rir e dizer: – “Mané, você não desiste nunca”

E a resposta: “Pois é, Mané…Como é que se desiste? A gente não pode desistir..”

A hora e a vez de Dhan Nascimento

 

 

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Show Reveillon 2014

 

 

“Acompanho o Dhan desde os tempos em que ele era o vocalista principal do Rasta Roots, uma banda que fazia covers de Reggae em Iaçu, Bahia. Ele emanava boas energias, transbordava carisma e a sua voz evoluiu muito com o tempo”. – Nilson Muller

 

Daniel, ou Dhan Nascimento, como é conhecido na cidade em que atua profissionalmente, é natural de Itaberaba, Bahia, cidade conhecida pelo progresso cultural e pela divulgação de seus jovens talentos. Reside na cidade de Iaçu,cidade conhecida pela beleza do Rio Paraguaçu e por sua atuação histórica durante o regime ditatorial que governou o Brasil entre os anos 1964 e 1985.

Durante muitos anos, a produção de abóbora desempenhou um papel fundamental na economia local, sendo uma das principais culturas do município.

Situada às margens do Rio Paraguaçu, a cidade tem grande potencial para crescimento. Porém, há ainda a necessidade de projetos que visem diminuir o êxodo de jovens para maiores centros. Por falta de oportunidade profissional, muitos jovens migram para cidades maiores. Para reverter esse cenário, é crucial desenvolver oportunidades profissionais locais e criar um ambiente propício para o crescimento econômico.

Atrair investimentos privados poderia impulsionar a economia local, assim como fez o município de Castro Alves com uma grande fábrica de calçados e a fábrica de ração, que servem de impulso e âncora para mão de obra local – mais de 300 famílias foram beneficiadas.

Os maiores empregadores em Iaçu são comerciantes, donos de supermercados, farmácias, lojas, padarias, bares e lanchonetes. Outros empregadores são do serviço público e uma empresa de logística. Muitos têm seu primeiro emprego em pequenos estabelecimentos e isso contribui também para a economia do município. Alguns desses comerciantes apoiam a expansão da cultura promovendo apresentações de talentos locais nos finais de semana. Assim como as águas do Rio Paraguaçu no período das cheias, a cidade transborda de novos talentos.

Neste post, Dhan Nascimento, será o nosso foco.

Dhan iniciou a sua carreira em meados dos anos 2011, sendo o vocal principal do Projeto Rasta Roots, Banda que especializada em covers de Reggae que iam desde Edson Gomes, Sine Calmon à Bob Marley and The Wailers.

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Foto Show dos Rasta Roots

O projeto durou  aproximado de dez anos, com a banda em sua formação original. Neste período foram gravados alguns CD’s das apresentações ao vivo da Banda. Os shows eram marcados pela energia e o dinamismo do Reggae, a alegria do público que participava nos passos cadenciados impulsionados pela melodia bem executada do ritmo que veio da Jamaica, uma das ilhas do Caribe.

A falta de oportunidades para divulgação do trabalho e a impossibilidade de conciliação com os novos projetos dos membros da equipe levaram ao fim da Banda.

Em 2019, ele concentrou o seu trabalho em músicas românticas, no estilo conhecido como Arrocha Sertanejo. No mesmo ano, gravou o seu primeiro CD entitulado “Pra falar de amor”. Os trabalhos de edição e mixagem foram realizados pela Edson Gravações Som!!!, em Itaberaba, Bahia.

A divulgação se deu por meio de shows e contribuições em shows de outros artistas.

Esses shows renderam a gravação de um trabalho ao Vivo, em 2020.

O segundo trabalho em Estúdio, “Pra recordar, traz em sua essência grandes sucessos das décadas de 1980 e 1990, adaptados ao ritmo Arrocha Sertanejo.

Em 2022, a escassez de shows depois do período de pandemia mundial da COVID-19 e a necessidade de organizar um novo repertório, exigiram de Dhan Nascimento pausa no trabalho, para no ano seguinte, 2023, retornar com um projeto desafiador: Lançar um CD agora apenas de músicas autorais.

Inicialmente, Dhan investiu na gravação de um EP com quatro músicas de trabalho, saindo em sequencia a gravação de um CD completamente autoral, cujo título é “Pra maltratar os corações, Com amor lembro, choro e bebo”.

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Primeiro trabalho completamente autoral

Os trabalhos de gravação edição e mixagem foram realizados no Estúdio Isaías Gravações, em Iaçu.

Suas apresentações conservam a mesma energia dos tempos do Reggae, numa bela interação entre músico/público.

São cinco álbuns ao longo da carreira, trabalhos em estúdio e um ao vivo, em que mescla músicas autorais e covers de diversos artistas do gênero.

 

Leia também Onde as flores não florescem ‣ Jeito de ver

Conheça mais o trabalho do Dhan, no Spotify.

 

O goleiro que pegava até pensamentos!

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Imagem de jotoya por Pixabay

 

 

Poucos goleiros foram tão bons na história do futebol, quanto o João Rodrigues, lá do XV de Setembro, embora muito poucos o saibam.
Mas, XV de Setembro? Não seria mais apropriado e significativo o XV de Novembro, data em que, foi proclamada a República naquele país?
Creio que ou o Sr. José Rodrigues não era muito bom em memorizar datas, ou quem sabe, na hora de registrar o nome do clube, Aurelino, o escrivão, não escutou muito bem, e por causa da animação de ver o novo time da cidade ganhar corpo, as conversas fluíram sem que ninguém percebesse o erro na bendita data!

Apenas na hora de inscrever o XV no campeonato é que perceberam o erro no nome.
Mas, apesar disso, João Rodrigues, que por coincidência era filho do senhor José, dono time, era o goleiro.
Sim, apesar desta coincidência, antes que alguém fale de nepotismo, ele realmente era um grande goleiro!
Enquanto a atitude da maioria dos goleiros era reativa, este parecia adivinhar o que os pobres atacantes dos times adversários fariam.
Os jogadores mais inteligentes ficavam frustrados, pois nenhuma invencionice ou improviso dava certo. – A bola não passava!
E como diziam, sem saber: “Ele pegava até pensamento!”

Mas, o pior é que isso era verdade! Não sei como, mas ele realmente conseguia ler os pensamentos dos atacantes, quando estes diziam no íntimo: “Vou jogar o corpo para a direita e cavar no meio…”, ou intencionavam humilhar o goleiro num drible da vaca espetacular.

Ele era mestre em frustrar planos!

Como numa dessas maravilhas ou milagres ele lia os pensamentos de seus adversários, por mais que inteligentes ou habilidosos que fossem!
Era estarrecedor! Nem mesmo ele sabia o por quê de suas habilidades!

Na primeira partida, muita emoção, daquelas de fazer defunto gritar: “ÊEEEba”,  que foi contra o 2 de Novembro, o time estava sendo massacrado. Não à toa o 2 de Novembro era famoso por enterrar seus adversários!
A pressão intensa e os gritos da torcida anunciavam a tragédia. O XV perderia fatalmente  – mesmo com a atuação quase perfeita da zaga que não permitia maiores avanços.
Mas, aos 44 minutos do segundo tempo o melhor jogador do campeonato, o Mestre Jorge (que nas outras horas era um excelente professor!) teve a sorte de ver a bola passar pela zaga e deixá-lo frente a frente com o João. A bola fatal passou pela zaga, a muralha do time do seu José, no úlitmo minuto, e Jorge poderia então se consagrar.
E o improvável aconteceu!!!

Apenas João Rodrigues no centro da meta e todo o espaço do mundo para colocar a bola…

De repente, Jorge para…e visivelmente transtornado senta com ares de tristeza.
Ninguém entendia o por quê!
Realmente, era inexplicável!

Mas, a entrevista  pós jogo, revelou parte do mistério.
Naquele momento – todos os pensamentos do artilheiro foram apanhados!

Ele nem mesmo sabia o que fazia em campo!

O abatimento após o lance serviu de incentivo para o 15, e aos 46:58 do segundo tempo, veio o gol da vitória.
Sua primeira vitória, logo na estreia, na casa do adversário!

E assim se deu por todo o campeonato, os atacantes do Barra Rasa, agiam como se não tivessem um objetivo em campo.
O Barra Funda, que era o time do irmão do Barra Rasa, achou que tinha aprendido do fracasso do time irmão, da parte mais rasa e na surdina resolveu pagar um extra ao juiz para facilitar a sua vida, e como precisava da vitória – gastou, e não foi pouco!

Aos 43 minutos do segundo, num lance normal em que nem o Rolando Júnior se atiraria ao chão – Romualdo, o juiz, apitou e apontou para a marca da cal, sinalizando pênalti.

A torcida vibrou, apesar do lance vergonhoso!

O XV de Setembro protestou – mas, o juiz manteve-se irredutível!
E Mauro Foguete, o principal batedor, ajeitou a bola, escolheu o canto e correu para a cobrança do pênalti.
Os nove metros que o separavam da consagração pareciam nove quilômetros!
E ele correu…e no último passo…esqueceu de tudo!

E num chute infantil o goleiro defendeu sem o mínimo esforço.

Insatisfeito, o juiz apontou uma irregularidade inexistente, e outro jogador foi selecionado e…
Pimba!
Perdeu os pensamentos!
E o mesmo aconteceu com o todo o elenco do time adversário!
E com o Barra mentalmente esgotado, desmoralizado, o XV num ataque rápido conseguiu a vitória.

Não havia mais adversários.

E na partida final do campeonato, o time com erros no nome, mas já campeão, enfrentaria o time menos temido.
O Inerte Futebol Clube.
Diziam que os jogadores do Inerte F.C eram quase mentecaptos, que serviam como postes em algumas ocasiões.

O XV de Setembro já comemorava antecipadamente a vitória.

O Inerte era tão ruim, que os jogadores eram conhecidos pela burrice e improdutividade em campo. Perderam todas as partidas pelo placar  mínimo de 13 a zero!

E a partida começou e de cara Tinho, o lunático, conseguiu fazer o impossível! Marcou o primeiro gol no XV.

O apanhador de pensamentos ficou perdido, sem saber o porquê.

O pior estava por vir, Leopoldo, que era apelidado de Pordo por alguns e de Potro por outros, converteu todos os chutes em gol!

João Rodrigues estava arrasado, não entendia porque errava tanto!

O XV de Setembro foi campeão, mesmo levando 11 gols do Inerte F.C.

E assim se deu…

O goleiro do XV de Setembro não conseguia segurar nada que fosse de proveito da mente dos jogadores do Inerte F.C.

João Rodrigues aprendeu…não havia nada a pegar daquelas mentes…

E passou então a estudar melhor seus adversários para o próximo campeonato, pois entendeu que de algumas mentes NADA SE APROVEITA!

Gilson Cruz

 

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O mundo dos robôs – um pesadelo futurístico

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Imagem de Pete Linforth por Pixabay

“E no futuro, os robôs substituirão o trabalho humano…

Ninguém mais será escravizado.

Todos terão tempo para dedicar à família, aos amigos… à vida.”

Assim, o primeiro trilhardário do planeta esbanjava seu otimismo para o futuro.

Suas imensas pastagens, antes cuidadas por humanos que reclamavam das péssimas condições de trabalho, que reclamavam do salário que não dava para comprar aquilo que eles ajudaram a plantar… e que adoeciam por causa disso – causando prejuízo ao amoroso patrão que, por anos, era, apenas, um pobre bilionário.

O mundo agora arruinado, população reduzida, ocupado apenas pelos que se beneficiaram da escravidão ao longo dos séculos, era um lugar tranquilo – sem pobres. Os rios e mares agora, tinham donos. Assim como os países e as cidades.

Marte não chegou a ser ocupado. A nave explodira com os primeiros bilionários que tentaram colonizar o planeta vermelho, ninguém soube o motivo. A base lunar também não fora ocupada, ficou apenas no sonho de veraneio de quem tinha muito a gastar.

Um pobre milionário talvez não tivesse os robôs da última geração e comprasse dos pobres bilionários, robôs usados.

Enquanto os pobres pobres, que passaram uma eternidade bajulando e comendo as migalhas, se resumiam ao que não mais se designavam humanos – eram subumanos. Agora, menos importantes que robôs, faziam o impossível para sobreviver…

As máquinas do futuro eram condicionadas, assim como os pobres do passado. Não tinham direito a sonhar, às aspirações que todo ser humano precisa ter para crescer, para se realizar. Recebiam ordens e distrações necessárias à cegueira de uma vida sem sentido – enquanto eram gradativamente substituídas! E, mais tarde, enquanto as máquinas faziam o trabalho, as fontes de energia cessaram – e elas pararam!

Pararam como humanos, mortos pelo cansaço e pela exploração.

Os subumanos foram então lembrados… quais escravos!

E voltaram a ser escravos, que se queixavam, que reclamavam – que eram condicionados, programados para isso! E a vida continuou assim, sem rumo, até o fim – até que o pesadelo acabasse!

Gilson Cruz

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Ao vizinho do 61 – Muito Obrigado!

Uma porta marrom, uma parede cinza. Um texto para reflexão.

Imagem de Arek Socha por Pixabay

 

Meu caro vizinho da casa 61

 

Sei que a vida anda apressada ultimamente, é verdade, e são raras as vezes que tenho a oportunidade de te encontrar – sem essa pressa maldita, tão comum às pessoas.

Mas, quero te agradecer.

Confesso que vendo a disposição e a força em que realizas tão bem os teus trabalhos, sempre acreditei que eras um Super-homem.

Por isso, quando ao te cumprimentar com aquele simples “bom dia”, eu não esperava ouvir tantas histórias.

Saber que tu enfrentas sentimentos como a solidão, a depressão e problemas da natureza humana diariamente, me ajudou a considerar melhor a minha vida. Eu, que vivo entre livros e músicas, que torço por um time que não ganha um título nacional desde 1989 e que sempre acreditei também não haver nada errado com o Senhor.

Percebi, que constrangido, tu narravas um pouco dos teus problemas de infância e quantas visitas ao hospital a tua saudosa mãe se via obrigada a fazer – chorar ao recordar alguém que te amava e que também se importava tanto contigo, não é crime. Fez muito bem!

Eu jamais saberia, é certo, que apesar desta força que mostras nos teus passos há um ser humano mais forte ainda. Pois lidar com certos problemas pode ser desgastante e desanimador – e alguns, infelizmente, desistem no caminho.

Não, eles não são fracos! Eles lutaram, também!

Talvez, não encontrassem ouvidos sinceros, de pessoas que se importassem.

Hoje em dia, quando as pessoas que perguntam “Como está?”, o fazem por formalidade, muitas vezes sem nenhum interesse nos outros. Querem ouvir a única resposta que os agrade, para se isentarem do peso de serem úteis!

Quando te cumprimentei e ouvi a tua história, ganhei muito mais do que motivos para acreditar.

Ganhei uma razão para continuar.

Disseste-me sentir a falta de teu Pai, tua irmã, teus amigos – me identifiquei, pois os meus livros – apesar de maravilhosos, não compartilham os meus sentimentos.

Por favor, peço apenas que não desanimes ao encontrares aqueles que querem apenas ouvir um “estou bem”, por estarem ocupados demais com os seus próprios egos. É duro admitir, essas pessos existem e pouco se importam com os outros. Vão te dizer que falar dos teus problemas é fraqueza, que existem coisas importantes pra pensar, mas não esmoreça.

Entenda, desabafar, é também uma maneira de reorganizar os pensamentos e aquele que te escuta, se for sincero, terá o privilégio de aprender e crescer junto contigo.

Te peço perdão, por não ter me  lembrado de perguntar o teu nome, mas a tua história de lutas e sofrimento ainda comove e me inspira. Continue a luta.

Agradeço, por ter confiado, a tua história e a tua voz, a um desconhecido que também nem sabias o nome. Acredito que todo o altruísmo, foi teu. E numa próxima ocasião, espero encontrar-te novamente e conversarmos um pouco mais, compartilharmos experiências e ter a chance de conhecer também a tua família, tocarmos algo em meu velho Di Giorgio e descobrir também, os teus talentos.

Agradeço e até uma próxima oportunidade,

Pedro,

Teu vizinho do N° 15.

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Gilson Cruz

 

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